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Givenchy foi o mago dos ricos chiques
Opinião

Givenchy foi o mago dos ricos chiques

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Morreu o costureiro Hubert de Givenchy. Não fará falta, porque seu mundo acabou há décadas. Será eternamente lembrado, sempre que uma mulher vestir um "pretinho" parecido com o de Audrey Hepburn no filme "Bonequinha de Luxo".  

Quando ela entrou no ateliê, Givenchy decepcionou-se com aquela moça de roupas banais. Ele achava que sua nova cliente Hepburn seria a já famosa Katherine. Daquele encontro resultou uma amizade de 40 anos marcada pela seu estilo, classe e elegância.  

Em 1992, Audrey estava ligada a aparelhos, morrendo de câncer nos Estados Unidos, queria passar o Natal na sua casa da Suíça. Não podia viajar num voo comercial, pois seu estado exigia um controle especial da pressurização durante o pouso. Givenchy ligou para uma de suas clientes, Bunny Mellon, e pediu-lhe o jatinho. Audrey Hepburn viajou num avião decorado com flores brancas e morreu em casa semanas depois.  

O mundo da alta-costura já tinha acabado em 1995, quando Givenchy se aposentou. Talvez tenha acabado em 1968, quando o genial Cristóbal Balenciaga fechou sua casa de Paris, horrorizado com o que acontecia na rua. Acabou-se o tempo de estrelas que tinham horror a holofotes (Audrey Hepburn) e bilionárias capazes de ensinar que "nada deve ser notado", como Bunny Mellon. Num só ano, a senhora gastou na Maison Givenchy o equivalente a 700 mil dólares em dinheiro de hoje, mas passava despercebida.  

Hoje não existem grandes costureiros. Balenciaga, ambidestro, costurava com as duas mãos. Givenchy comandou a confecção do casaco de luto da Duquesa de Windsor para o enterro do marido em um dia. Dizia que o cabelo de Ivana, a primeira mulher de Donald Trump, parecia um repolho e jamais vestiria a cantora Madonna, pois não desenhava "fantasias".  

No Met Gala de 2016, Madonna apareceu com uma fantasia da etiqueta Givenchy que lhe expunha o traseiro. Ele nada tinha a ver com isso. No mundo em que não há mais alta-costura, todas as marcas do passado foram compradas por conglomerados financeiros. A Maison Givenchy pertence ao grupo LVMH. As iniciais vêm de Louis Vuitton (famoso fabricante de malas), Moët (champanhe) e Hennessy (conhaque). Seu poderoso executivo é Bernard Arnault, um engenheiro que jamais desenhou uma saia ou apreciou um vinhedo. Ele é o imperador de um novo luxo, popular, comandado pelos grandes varejistas. Os vestidos que eram costurados em Paris hoje são feitos na China. O grupo LVMH tem dezenas de grifes, entre elas Dior, Kenzo e Pucci, ou as dos relógios Bulgari, Hublot ou TAG Heuer.  

De certa maneira, o luxo popularizou-se. Aquilo que um dia foi a clientela dos grandes costureiros cabe hoje no cadastro de uma só rede de revendedores. No final de sua carreira, Givenchy acompanhou a ousadia de Madame Chanel e lançou uma linha de perfumes. Ele gostaria de ter sabido que um ex-retirante nordestino chamado Lula deu a Marisa, sua mulher, um frasco de Amarige. Isso numa época em que o presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, usava colônia Monsieur de Givenchy.  

Hubert de Givenchy foi tudo isso, era marquês e também um homem bonito, com 1,96m e "nariz de rico", expressão criada por Danuza Leão para a estampa de Christine Lagarde, a diretora do FMI. Quem duvida que haja relação entre nariz e riqueza, olhe para o bilionário Jorge Paulo Lemann.

 

Elio Gaspari opiniao@opovo.com.br Jornalista

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