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Christiane Mudra: "Silêncio tóxico"
Opinião

Christiane Mudra: "Silêncio tóxico"

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Tipo Notícia

 

A filósofa Hanna Arendt descreveu a inabilidade dos alemães de diferenciar opiniões de fatos como uma consequência do nazismo. Neste ponto, ela escreveu em 1949, a ditadura atingiu o seu objetivo. A partir da interação do meu experimento teatral “yoUturn”, realizado em novembro em Fortaleza, eu observei outro fenômeno: o medo de fazer perguntas e expor a própria opinião. Um de meus entrevistados disse que um povo oprimido perde curiosidade e criatividade e torna-se indefeso, passivo e calado.


yoUturn examina as sistemáticas das estruturas de poder e opressão. A versão em Fortaleza lidou não apenas com temas de outros países, mas também com a ditadura brasileira, terminada como a ditadura da Alemanha Oriental na década de 1980.


Durante minha pesquisa no Brasil, eu estava incerta, porque eu temia apresentar coisas familiares aos brasileiros. “Estou chocado que você saiba muito mais sobre o meu País que eu”, disse um dos atores. Muitas pessoas não estavam familiarizadas com os conteúdos, embora muitos deles podem ser acessados online por meio do relatório da Comissão da Verdade. Nem na escola nem em famílias existia debate sobre a ditadura. Os espectadores reagiam excepcionalmente emotivos à performance. Muitos contaram suas próprias histórias sobre seus parentes torturados ou sobre as vigilâncias ilegais de ativistas pelas forças de segurança brasileira. De acordo com minha pesquisa, há informantes infiltrados em grupos políticos; a proteção de dados é um território desconhecido.


A ditadura foi enterrada com a Lei da Anistia na consciência do Brasil. Enquanto esse for o caso, a mesma continuará trabalhando subliminarmente. O impeachment de Dilma ano passado e o sucesso de Bolsonaro, que referenciou um torturador de Dilma em público e as recentes demandas por uma nova ditadura são as melhores provas. Mas o silêncio de chumbo nunca é permanente. Cedo ou tarde, a população pede um debate. A sentença contra os “voos da morte” na Argentina é apenas um de vários exemplos. 

 

Christiane Mudra

info@christianemudra.de

Escritora alemã, diretora e fundadora do

investigative theater.com 

 

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