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Editorial: o uso da "teoria da cegueira deliberada" na Lava Jato
Opinião

Editorial: o uso da "teoria da cegueira deliberada" na Lava Jato

A doutrina permite a condenação de um réu mesmo que as provas apresentadas contra ele sejam frágeis
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O jornal Folha de S. Paulo publicou extensa matéria (28/12/2017) mostrando que os juízes à frente dos processos da Operação Lava Jato estão usando com frequência uma “doutrina jurídica estrangeira” para fundamentar condenações pelo crime de lavagem de dinheiro, quando se defrontam com provas frágeis para inculpar os acusados.


Essa doutrina, conhecida como “teoria da cegueira deliberada”, é mais utilizada nos Estados Unidos e alguns países da Europa, tendo sido formulada no século XIX, na Inglaterra. Por esse método o juiz pode considerar culpada uma pessoa que movimentou dinheiro ilegal, mesmo sem que ela tenha conhecimento da natureza ilícita dos recursos. Ou seja, durante o julgamento, o juiz reconhece não haver provas que o réu soubesse que o dinheiro era resultado de corrupção, mas o condena assim mesmo, sob o argumento de que ele tinha motivos para suspeitar da irregularidade.


Pelo levantamento do jornal, desde o início da Lava Jato, os juízes de primeira instância Sergio Moro (Curitiba) e Marcelo Bretas (Rio de Janeiro) condenaram 121 pessoas por lavagem de dinheiro, sendo 13 delas com a aplicação da doutrina da cegueira deliberada, incluindo João Santana, ex-marqueteiro do PT, e sua mulher Mônica Moura. Mas não é novidade a aplicação de doutrinas oriundas de outros países pelo Judiciário brasileiro, como foi o caso da teoria do domínio do fato, utilizada na ação penal 470, conhecida como “mensalão”.


Entende-se que o Judiciário queira combater a impunidade, principalmente quando se trata de crimes complexos, como lavagem de dinheiro, que deixam poucas pistas, restando ao juiz estudar o contexto para chegar a alguma conclusão. Mas há de se levar em conta que essas fórmulas não constam no Código de Processo Penal brasileiro e podem levar ao cometimento de graves injustiças.


Portanto, em tema de tamanha envergadura, o melhor seria ampliar o debate, levar o assunto ao Legislativo para que seja mais bem estudado. E, se for o caso, incorporar a doutrina ao ordenamento jurídico brasileiro com os cuidados necessários para não deixar aberta uma porta tão larga à subjetividade de cada julgador

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