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W. Gabriel: "Atirei a internet no gato-tôtô"
Opinião

W. Gabriel: "Atirei a internet no gato-tôtô"

Vivemos em uma época em que a audiência sobre o que é expressado é mais importante do que a liberdade de expressão
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Quando pensamos em falar de alguém ou de uma empresa entre nossos amigos e familiares, aparentemente essa conversa é controlada pelo espaço onde nós estamos. Se for uma acusação, uma suposição ou a velha fofoca, depois pode perder importância e até ser esquecida. Contudo, não retira o risco de se ter criado uma imagem negativa sem certeza. Neste momento, você se torna cúmplice da inquisição, sem ter na mão as provas do crime.

 

Dizem que o ser humano, em geral, sempre foi assim. Criador de histórias, de conversas na calçada, amante das teledramaturgias... O pensador Martín-Barbero ressalta até o latino-americano com veias culturais mais acentuadas nesse viés comunicacional. Seria isso uma vantagem ou uma bomba-relógio que samba de mão em mão, podendo ser arremessada ao léu a qualquer momento?


A diferença do papo na praça, hoje, é que as conexões humanas correm em fibra óptica. O pau que se atira no gato-tôtô, atualmente, mata o gato sem que o espere berrar. A admiração vem sobre quem não concordar com a paulada. E, assim, a internet vira muro de fuzilamento, cujos atiradores traem com seu like.


“É só uma opinião, quem vai se importar?”, diriam as pipocas. Talvez o fuzilado, sem chance de defesa, até sua segunda ou terceira geração, por ninguém ter se importado pela apuração real dos fatos. Reclamamos de emissoras de TV manipuladoras, mas adoramos sentir esse poder na mão. Diante de verborragia sobre a democratização da informação na internet, juntamo-nos fácil às tropas de massacre coletivo digital. Lemos manchetes no Facebook e já temos uma opinião, mesmo sobre fakenews. Vemos fotos ou vídeos evidenciados no Instagram ou WhatsApp, já autenticamos sua veracidade, mesmo alteradas. Saiu na maior revista ou no maior jornal da TV e já carimbamos nossa aprovação, mesmo sem nunca ter lido o editorial. Por falar nisso, quem aqui conhece o editorial do seu blogueiro preferido?


O pau atirado no gato-tôtô mata. Se for on-line, pode exterminar a espécie. Mas poucos se preocupam em arremessá-lo; portanto, que seja aceito no grupo e ganhe curtidas e compartilhamentos dourados no peito. Afinal, audiência é tudo, como ensinou parte da grande mídia tão criticada quanto confiada pelos brasileiros. É pop ser inquisidor. Se der certo, talvez vire youtuber e ganhe 10 cents de dólar a cada mil visualizações.


Vivemos em uma época em que a audiência sobre o que é expressado é mais importante do que a liberdade de expressão. Colocar-se rapidamente traz mais likes do que entender para se colocar de forma justa. Se fosse hoje, não acredito mais que Dona Chica-cá admirasse-se com o berro, com o berro que o gato deu. Ela compartilharia. Miau. 

 

W. Gabriel

wgabriel@wgabriel.net
Mestre em marketing, professor e consultor de marketing em
mídias digitais

 

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