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Marcus Vale: "Somos o que comemos?"
Opinião

Marcus Vale: "Somos o que comemos?"

O curioso é que boa parte dos desprovidos de recursos é obesa, indicando que a oferta de comida não é tão crítica
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Sempre que aprecio imagens da Fortaleza Belle Époque, observo, nas ruas da Cidade, uma maioria de homens, de paletós, gravatas e chapéus. Apesar de ser moda na época, não eram vestimentas apropriadas ao clima da Cidade, considerando o calor dos trópicos. Entretanto, ressalto que as roupas eram brancas ou de cores claras, adequadas aos climas quentes como o nosso. Lembro-me ainda de meu pai, nos anos 1950, que trabalhava no comércio, usando seu paletó e gravata na lida diária. Com o passar dos anos, a gravata foi abolida e depois caiu o paletó e o chapéu.


Porém o que mais me chama a atenção nas antigas fotos é o fato de não se visualizar obesos. A maioria das pessoas era magra, em grande contraste com o que se observa atualmente nas nossas cidades. Hoje, circula nos nossos espaços públicos uma grande quantidade de obesos (masculinos e femininos), alguns já quase na fase mórbida.


O curioso é que uma boa parte dos desprovidos de recursos também é obesa, indicando claramente que a oferta de comida não é tão crítica. Entretanto, sabe-se que consomem, preferencialmente, alimentos não saudáveis como refrigerantes, biscoitos etc. Em certos países africanos, onde a fome afeta boa parte da população, alguns são absolutamente magros, eu até diria esqueléticos, indicando uma falta real de ingestão de alimentos.


Conheci uma fotógrafa italiana que decidiu desenvolver um projeto numa comunidade pobre de Fortaleza que tinha como meta fotografar o interior das geladeiras dos moradores. Ela mostrou seus resultados numa palestra. Suas fotos exibiam geladeiras meio vazias de alimentos, mas quase todas continham refrigerantes e ausência de leite, por exemplo, mesmo a despeito de leite ser mais saudável e mais barato que refrigerante.


Observo nos meus netos uma certa repulsa à comida normal e saudável, oferecida pelos pais. Na verdade, as crianças gostam mesmo é de doces e outros petiscos, induzidas também pela massiva propaganda midiática.


A propósito disso, lembro-me bem de quando cheguei à Inglaterra, no fim da década de 1970, para um período dedicado à minha formação acadêmica. Uma coisa que me chamou a atenção na TV britânica foi um grande número de anúncios de comida: doces, salgados, guloseimas empacotadas etc. Aquilo me surpreendeu porque, naquela época, aqui no nosso país, não víamos quase nada desse tipo de anúncio, ao contrário dos dias atuais.

 

Marcus Vale

valemarcus@yahoo.com

Diretor da Seara da Ciência e professor da UFC

 
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