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Daniel Fonsêca: "Catalunha: conflitos apenas começaram"
Opinião

Daniel Fonsêca: "Catalunha: conflitos apenas começaram"

No caso da Catalunha, é o Estado voltando-se contra as elites da segunda região mais rica do país
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O cenário do domingo (1º/10) do referendo sobre a independência da Catalunha teve acontecimentos graves: as polícias (civis) reprimiram a votação, impedindo aglomerações e fechando e invadindo os espaços de votação. Além disso, o governo conservador de Mariano Rajoy (PP), reeleito em 2016, agiu para tirar do ar sites pró-independência, numa violação à liberdade de expressão.


Isso parece pouco, já que, no Brasil, recorre-se sempre às armas “menos letais” e de “efeito moral”, com detenções e prisões arbitrárias, com claro corte de classe. Mas, no caso da Catalunha, é o Estado voltando-se contra as elites da segunda região mais rica do país, em plena União Europeia. Mesmo proibidas por lei, balas e bombas também foram usadas lá.


Os conflitos devem seguir com ou sem separação, já que o governo atual da Catalunha só foi possível porque, em janeiro de 2016, a CUP, de “extrema-esquerda”, absteve-se para levar ao poder a frente separatista de centro-direita do Junts Pel Si. Na Espanha, mesmo os governos municipais e autonômicos são “parlamentaristas”.


Não é possível analisar o movimento separatista apenas por interesses de classes ou como um processo com evidentes conquistas populares. Aspectos identitários, sozinhos, também são insuficientes. Com PIB quase igual ao da Comunidade de Madri, a Catalunha tem perfil muito elitista.


O separatismo é tão difuso em objetivos e interesses que o Podemos – referência para as esquerdas brasileiras –, na prática, ficou em cima do muro: “queremos que Catalunha fique [na Espanha], mas que se vote [o referendo]”. Apesar de atacar o Rajoy pela repressão, não assumiu posição na profunda cisão que, hoje, não se limita mais à Catalunha.


Enquanto isso, na greve geral da terça (3/10), com milhares nas ruas contra a repressão, já começaram a brotar nas ruas conflitos entre civis, e os governantes da Catalunha já afirmam que a independência vai ser efetivada ainda em outubro. Do outro lado, algumas dezenas apoiaram as polícias.


Mas a complexidade tende a aumentar: o próximo foco deve ser o País Basco, onde, diante do relativo “êxito” catalão, já se reanima o ETA, grupo separatista terrorista bastante atuante entre os anos 1960 e 2000 que se prepara para iniciar uma atuação institucional. Não é pouca coisa. 

 

Daniel Fonsêca

fonsecaufc@gmail.com

Jornalista, é doutor em Comunicação e Cultura pela UFRJ e servidor da UFC

 

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