“Gravei com um espírito provocador e uma ironia rock’n’roll”, diria mais tarde Ney, que viu ali um jeito de falar de homossexualidade de forma descompromissada e impessoal. Claro que ver um dos grandes nomes da MPB, conhecido pela postura andrógina, dizer que “deixou aquela vida de lado” e já não é mais um “transviado” gerou muito bafafá. No entanto, o que seria uma participação especial para dar uma força a um grupo emergente tornou-se um problema, uma vez que a voz dos Miquinhos foi escondida para dar todo o destaque aos agudos do convidado.
O imbróglio teve um fim constrangedor. Ninguém entendeu de quem era a música e os Miquinhos acabaram sendo dispensados da gravadora de qualquer forma, enquanto o álbum de Ney vendeu muito bem. Mas Ney fez pouco caso do sucesso de Calúnias, que não foi cantada em shows e ainda foi excluída das reedições de ...Pois é. Curiosamente, dois anos antes, o intérprete vendeu muitos milhares de discos com uma faixa que poderia ser o oposto de Calúnias: Homem com H, ainda hoje presente em seus shows. Seria porque Ney Matogrosso não tem pudores para expressar suas opiniões e prefere dar orgulho à mãe a pedir perdão pelas “manchas do passado”. Mas, quando assunto é intimidade, ele se dá o direito do silêncio. O mesmo vale quando o assunto é política. Quando dizem que Ney anda mais à direita ou à esquerda, ele pega o microfone e canta O Tempo não Pára. Recado dado.
Marcos Sampaio
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