Geraldo Amâncio, cearense de Cedro, é um dos grandes da poesia e da cantoria, expressão das mais sofisticadas das artes do povo. Esse admirável cantador tem a sagacidade repentista de um Pinto do Monteiro, a erudição de João Martins de Athayde e Leandro Gomes de Barros, a aura mítica e o empreendedorismo de um Cego Aderaldo, a jocosidade de um Louro Branco e a consciência social de um Patativa do Assaré. A história desse artista do povo mescla-se, assim, com a melhor herança cultural nordestina. É um multicampeão em festivais e congressos de cantoria, obtendo mais de 150 primeiros lugares, em mais de 200 festivais competitivos de que participou. Tal fato demonstra que, além da inspiração e da grande capacidade de improviso, é dono de memória e domínio da técnica de cantoria realmente extraordinários.
Nos anos de 2004 e 2005, idealizei e fiz a curadoria do Festival Internacional de Trovadores e Repentistas – FestViola, no Ceará. O evento foi um grande sucesso e entrou para a história da cantoria, segundo o conceito de muitos, como um dos mais importantes feitos de promoção e reconhecimento da cantoria, alargando horizontes e abrindo novas possibilidades de intercâmbios internacionais para os cantadores regionais. Geraldo Amâncio daria continuidade a esse importante evento, realizando o FestViola nos anos seguintes. Em 2005, Geraldo Amâncio e Pedro Bandeira desembarcavam em Portugal, a convite do Museu de Etnologia de Lisboa, para cantarem com grandes repentistas portugueses. Em 2008, Geraldo Amâncio ministrou palestra sobre “cantoria e poesia popular”, na Universidade de Coimbra. A partir do FestViola, travou contatos com payadores chilenos, uruguaios e argentinos, bem como com trovadores, improvisadores de sextilhas e décimas, de Cuba, do México e da Venezuela, participando de festivais internacionais - dentre eles, o XVI Festival Mundial de Repentistas, nas Ilhas Baleares, na Espanha. Quebram-se, assim, as fronteiras da região, e a cantoria começa a ser reconhecida, a partir da sua própria origem e nas suas novas formas, como manifestação transnacional.
Geraldo tem publicado vários livros sobre cantoria. Para quem deseja entrar em contato com a qualidade da sua poesia, eu recomendo a leitura do livro “O Beato Zé Lourenço, o Caldeirão e a matança dos Romeiros” (Premius Editora). O livro é uma obra literária de fôlego, de relevante conteúdo histórico, que pode ser compreendido também como a expressão lúcida da consciência política e popular, em determinado tempo da história.
Rosemberg Cariry
ar.moura@uol.com.brCineasta e escritor