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José Jackson Coelho Sampaio: Poesia: código de expressão e resistência
Opinião

José Jackson Coelho Sampaio: Poesia: código de expressão e resistência

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O que é poesia? Aventura lúdica da e na linguagem, radicalmente humana, para memorizar, comunicar, sentir-se maior que a fragilidade e a extensão do corpo, esforço ingente de dar nome ao sem nome, diário dos sentimentos que incomodam, por falta ou excesso, por prazer ou dor, diário de expressões e resistências, forma do início ou do fim do mundo.

 

Resistência de desejo, amor e perdas – Cantadas e suplício das traições, clamor diante do sofrimento e da finitude, tudo o que ocorre e é preciso dominar, nominando. O desejo realizado e o interdito, a pulsão primitiva e a díade pornografia/erotismo, nem sempre distinguível, embrionam a experiência humana sob a forma de linguagem.


Diário de campo das culturas ameaçadas de extinção e do cotidiano – O cancioneiro Terena no Brasil, o Guarani no Paraguai, o Mapuche no Chile, o Nahuátl no México, jaculatórias, mantras, sutras, ditados populares, quadras, repentes, memórias dos salmos bíblicos, mensagens de publicidade, letras de música. Tudo por aí, nas frestas, interfaces e interstícios do cotidiano.


Resistência da identidade e do sofrimento psíquico - Crianças, indígenas e loucos de todo gênero comunicam-se assim, declaram os transtornos e dizem do conflito, da contradição, do antagonismo na consciência assim.


Resistência política - O jornal do vivido nas condições são adversas. Aquilo que não sai no New York Times, na Globo, na Folha, no O POVO. Vocalização de frustrações, humilhações e raivas, ritualizadas e desviadas da violência, expondo as vísceras do real. Fala cantada das religiões milenares (Canto Gregoriano) e das periferias marginalizadas (rap, hip hop), ou os presos poetas de Guantánamo.


O fim da poesia ou o fim de uma forma e de uso da poesia - Contra a visão apocalíptica, pois, feito Fênix, feito Cobra de Vidro, a poesia sempre renasce. Linguagem essencial do humano, que se esgueira, escapa da norma e do reino da mercadoria, como nota lírica ou épica, palavrão ou onomatopeia, sussurro amoroso ou suspiro contra a morte.

 

José Jackson Coelho Sampaio

jose.sampaio@uece.br

Professor titular em Saúde Pública e reitor da Uece

 

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