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O futuro do jornal depende de um novo relacionamento com o leitor
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O futuro do jornal depende de um novo relacionamento com o leitor

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[FOTO1]POR ROSENTAL CALMON ALVES
 
UM VETERANO JORNALISTA BRASILEIRO QUE, DESDE 1996, É PROFESSOR DA ESCOLA DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE DO TEXAS EM AUSTIN, ONDE FUNDOU E DIRIGE O CENTRO KNIGHT PARA O JORNALISMO NAS AMÉRICAS

 
Ao comemorar 90 anos de serviço público para o Ceará e o Brasil, O POVO se encontra diante de grandes desafios sobre o seu futuro. E não está sozinho nisso. Todos os jornais do mundo enfrentam os mesmos dilemas criados pela revolução digital que, nas últimas décadas, tem transformado o mundo muito mais radicalmente do que percebemos no nosso dia a dia.

 
Como será O POVO daqui a 10 anos, quando estiver celebrando seu centenário? Como será o New York Times? O Washington Post? O Le Monde? A Folha? O primeiro desafio é encontrar um modelo de negócio menos dependente da publicidade. O segundo é mudar o seu relacionamento com os leitores para que eles se sintam mais sócios do que clientes.
 
 
Na era industrial, o jornal era um produto manufaturado, vendido por um preço inferior ao seu custo, graças ao subsídio obtido com a publicidade. Infelizmente esta continua migrando para plataformas digitais, nas quais os jornais só conseguem obter uma fração do que faturavam com o impresso.
 
Na era digital, o jornal é um serviço público em busca de subsídios (receita) mais diversificados, indo muito além da publicidade. Nos Estados Unidos, a propaganda representava uns 80% do faturamento dos jornais, enquanto a circulação (assinaturas e venda avulsa) cobria os outros 20%. Há uma reversão desta fórmula. Os leitores já contribuem mais que a publicidade em muitos jornais.
 
No caso do New York Times, desde 2012 a receita com assinantes (impresso e digital) supera a de publicidade. Na busca de novas receitas, o Times surpreende com serviços, como a entrega de comida a domicílio (ingredientes para as receitas que publica) ou o turismo pelo mundo afora na companhia de seus jornalistas. Eventos, cursos, comércio eletrônico, publicações especializadas são outros exemplos de iniciativas que estão mudando o modelo de negócio dos jornais.

 
O Washington Post também está contando mais com seus leitores. Em pouco mais de um ano, conseguiu um milhão de assinantes digitais, o que representa uns 100 milhões de dólares por ano. O marketing do Times e do Post não se baseia mais num apelo comercial tradicional e, sim, na conscientização de seus leitores de que eles precisam contribuir mais do que antes para que a sociedade possa contar com seu jornalismo independente e de interesse público. “A democracia morre na escuridão” é o slogan do Post, enquanto o Times proclama que “a verdade não é fácil” (e custa caro buscá-la).

 
O sucesso dos jornais na próxima década dependerá de uma nova relação com seus leitores. O leitorado terá de pagar mais pelo impresso e pagar algo pelo acesso online (ainda grátis na maioria dos casos). Além disso, os jornais precisam criar canais para que os leitores se sintam (e realmente sejam) mais do que clientes ou consumidores de um produto industrial. Terão de se sentir sócios, participantes do novo jornalismo que está emergindo. O futuro dos jornais depende da criação de um novo relacionamento com sua comunidade de leitores.

 
Em 2011, tive a honra de visitar O POVO para seminários com jornalistas e administradores sobre o impacto da revolução digital no jornalismo. Desde os anos 1990, tenho feito esse tipo de “evangelização digital” em jornais ao redor do mundo. No Ceará, encontrei uma das empresas mais engajadas na transformação do jornalismo e do negócio que o sustenta. Ficou claro o foco nos leitores, no jornalismo como serviço público. Esta é a chave para enfrentar os desafios. Mas, como em todos os outros jornais, será preciso maior engajamento e apoio (inclusive econômico) dos leitores.
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