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"Toda mulher que não tem medo é livre socialmente"
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"Toda mulher que não tem medo é livre socialmente"

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Os medos de ser mulher e usuária do transporte público acompanham Simony César desde sua infância no bairro Dois Unidos, no subúrbio de Recife e com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). A jovem é a fundadora do Nina, uma tecnologia inovadora que possibilita provas - vídeos - para denúncias dos casos de assédio cometidos nos terminais e paradas de ônibus, bem como dentro dos próprios veículos. A ferramenta está disponível no aplicativo Meu Ônibus, da Prefeitura de Fortaleza, para usuários de Android e, em breve, também para iOS. Durante o lançamento do Nina, em Fortaleza, a fundadora falou sobre sua trajetória.

O POVO: O que a motivou a criar o Nina?

Simony César: Eu cresci numa família que trabalhava em transporte público. Minha mãe foi cobradora de ônibus durante muito tempo. Eu tinha na infância o sentimento de angústia e aflição que era de me preparar pra ver minha mãe pela última vez quando ela ia trabalhar às 4 horas, quando ela saía lá do subúrbio do Recife. Cresci com esse medo. Comecei a pesquisar como a violência na mobilidade urbana era um impeditivo de acesso e permanência das mulheres no ensino superior. Era uma pesquisa pra uma angústia minha, que vinha desde a infância.

OP: O que você fazia
na época?

Simony César: Design e queria usá-lo para algum benefício social. Foi quando aconteceu esses vários episódios (de assédio) dentro do campus, no meu trabalho, enfim, no meu próprio ir e vir, e eu decidi fazer.

OP: Quando foi desenvolvido?

Simony César: Foram vários Ninas antes desse. Vários testes. Comecei a pesquisa em 2016, enquanto aluna da UFPE. A primeira versão, enquanto aplicativo, foi em 2017. Foi quando eu percebi que tinha que mudar a tecnologia para um outro meio, para estar em vários aplicativos ao mesmo tempo. O Nina não é aplicativo. É uma tecnologia incorporada em aplicativos.

OP: Está presente em
outros aplicativos?

Simony César: Não. Fortaleza é o primeiro teste.

OP: Como você se sente?

Simony César: Não vou dizer que me sinto realizada porque eu não queria estar fazendo o que eu estou fazendo hoje. Eu não queria criar tecnologia pra fornecer segurança pras mulheres andarem nas cidades. Acho que isso não deveria ser necessário. Mas, enquanto suburbana, usuária de transporte público, filha de cobradora de ônibus, eu acho que a gente avançou muito.

OP: Por que Nina?

Simony César: Eu assisti um documentário, "What Happened, Miss Simone?", que é sobre a cantora norte-americana Nina Simone. Um jornalista perguntou o que ela entendia como liberdade. E a Nina respondeu que liberdade pra ela era não ter medo. Então eu tomei isso como um norte da minha vida. Acho que toda mulher que não tem medo é sim livre socialmente. A gente tendo medo deixa de estar numa universidade. Então, acho que toda mulher que é livre do medo no ir e vir, de fato, é liberta.

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