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Editorial. De ficção e realidade
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Editorial. De ficção e realidade

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Tipo Notícia


Como tudo o que acontece no Brasil atualmente, não passaria sem protestos a série O Mecanismo, inspirada na operação Lava Jato, assunto que também já havia gerado o filme Polícia Federal - A lei é para todos, de Marcelo Antunes, do mesmo jeito alvo de polêmica.


A série, produzida pela Netflix e dirigida por José Padilha, conta o início da operação que ainda investiga o maior esquema de corrupção no Brasil. A primeira temporada termina com a prisão de empreiteiros participantes da rede criminosa.
 

Apresentada como “obra de ficção inspirada em fatos reais”, a série traz personagens identificáveis para quem acompanha os acontecimentos políticos. E os problemas começam aí. Padilha passou a ser recriminado por, supostamente, falsear a realidade, principalmente ao pôr na boca do personagem João Higino (o ex-presidente Lula) a famosa frase de Romero Jucá, qual seja, a necessidade de “estancar a sangria” da Lava Jato.
 

Janete Ruscov, a personagem que representa Dilma Roussef, aparece no filme em situações comprometedoras, das quais a ex-presidente não participou. Assim, Dilma passou a acusar Padilha de espalhar “fake news”. Em favor do diretor diga-se que suas investidas não se restringiram aos personagens petistas. Thames (Temer) e Lúcio Lemes (Aécio Neves) são apresentados como golpistas e conspiradores.

Mas a questão é: pode-se exigir de um filme, de um quadro ou de um livro que eles respeitem os “fatos”, quando o próprio conceito de obra de arte pressupõe liberdade total para criar a sua própria realidade, inclusive aquela descolada da verdade factual? Assim, pode uma série de ficção - ainda que inspirada em fatos reais - ser acusada de produzir informação fraudulenta?

A resposta óbvia é não.
Agora, protestos contra a obra também são livres. E, talvez Padilha fizesse melhor se se dispusesse a responder as críticas sem desqualificar o interlocutor, como fez com a ex-presidente Dilma, a quem acusou de “não saber ler”, por ter desconsiderado o alerta no início dos episódios.
 

Aceitar críticas e saber diferenciar ficção e realidade ajudaria a desarmar os espíritos. 

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