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Uma noite de Swing
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Uma noite de Swing

| SEXO | Dois repórteres relatam experiência em uma festa de swing, prática em que casais liberais se encontram para trocar de par
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Jáder Santana (ELE) | jader.santana@opovo.com.br 

Iana Soares (ELA) | ianasoares@opovo.com.br 

(ELE) Sempre me interessaram as estratégias de subversão das instituições sob as quais se ergue nossa sociedade. Família, igreja, casamento, trabalho - o cânone da vida ocidental vez por outra fabrica, ele mesmo, a perturbação de sua ordem. Quando recebi o convite para um encontro de casais liberais - um swing de “amigos e amigos de amigos” -, pensei que seria a ocasião perfeita para observar como se articula essa indisciplina, como os envolvidos abandonam os modelos que ajudaram a construir. 

 

[FOTO1](ELA) No mesmo dia em que fui a um churrasco, a um velório e a um aniversário de criança, vi uma dezena de casais desconhecidos transarem no breu de uma sauna, nas cadeiras de um microcinema e em um corredor minúsculo, mas cheio de corpos. Sabia da pauta há algumas semanas, mas só na véspera me atentei: com que roupa se vai a um swing? Me aconselho com um colega que esclarece: roupa de balada. Compro um vestido que seria usado também na noite de réveillon, uma sandália de plataforma e um batom vermelho incrível. Tudo estratégia jornalística para passar despercebida.

 

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(ELE) Na entrada do local escolhido para receber o encontro, numa noite de sexta-feira de dezembro, chamava atenção a quantidade de carros que, do alto de minha ignorância automotiva, pude reconhecer como caros. Caríssimos. Na portaria, os nomes são checados na lista de convidados. Solicitam minha digital, minha parceiraa recebe uma pulseira de papel em um dos pulsos. Alugado especialmente para a ocasião, o espaço tem três andares: hall de entrada, bar/boate com piscina e, por fim, um piso dedicado ao sexo

 

(ELA) Depois de nos identificarmos como qualquer outro casal, registrar digital e pegar pulseirinha, subimos as escadas para entrar em uma espécie de salão de festas aldeotino, antes da meia-noite. Ainda que estivéssemos em uma badalada sauna alencarina, o ambiente tinha a normalidade de uma festa de antigos amigos de colégio. Havia um ar de intimidade nos beijos laterais, nos apertos de mão e na divisão clássica dos círculos não tão de humanas: mulheres de um lado, homens de outro. Compramos cervejas e sentamos na beira da piscina, tal qual Malinowski a observar os Argonautas do Pacífico Sul. Um pinheirinho com luzes azuis anuncia que é Natal.

 

(ELE) Subimos as escadas até o primeiro piso tentando fingir uma naturalidade que não nos dedurasse. Compramos nossas bebidas, circulamos pelo local, dançamos um pouco. Todos pareciam se conhecer, relembravam velhos encontros, citavam amigos em comum, acenavam para os que acabavam de chegar. Quando minha parceira se afastou para ir ao bar, fui abordado por um homem: “Eu te conheço do CRS”. Como? “Do CRS, te conheço de lá”. Acho que não, é minha primeira vez. “Primeira vez aqui?” Não, primeira vez no swing. Com uma animação nova, me agarrou pelo braço e me apresentou a sua esposa e amigos. Descobri depois que CRS é uma rede social exclusiva para casais liberais.

 

(ELA) A festa era de amigos e amigos de amigos, como nos explica um dos anfitriões. Mapeamos uma bailarina, um casal pró-impeachment, uma mulher que me mimetizava e batizamos de Iana. Um alterego afoito e dançante. Na porta do banheiro, ouvi uma moça que andava cansada, pois “já são vinte anos com o marido nessa brincadeira”. Ao subir para um sacada ainda no ambiente externo, conhecemos um rapaz que veio de sertão central só para a festa. 

 

(ELE) Devidamente apresentados, não demoramos a nos integrar a um dos grupos que dançava ao som de um DJ que ia do pop ao sertanejo, da eletrônica ao forró. Até aquele momento, e já estávamos na festa há mais de duas horas, não havíamos percebido nada de ostensivamente sexual. Apenas um clima quase juvenil de paquera, algumas risadas mais excitadas, investidas menos dissimuladas. Trocamos olhares com um casal que aparentava ter nossa idade e começamos a nos perguntar se, de fato, alguma coisa iria acontecer.

 

(ELA) No primeiro passeio pelo andar de cima, com a adrenalina e a curiosidade das primeiras vezes, não vimos nada. Era só aquilo mesmo? E o imaginário popular? O ménage, a orgia, a grande confusão? Cinema vazio, cabines idem. Nada demais. 

 

(ELE) Perto das duas da madrugada, como se alguém conectasse os cabos de uma corrente suspensa, o ambiente se transforma. Uma stripper mascarada dança duas ou três músicas enquanto tira toda a roupa que veste. Interage com os convidados, agarra a esposa que nos havia sido apresentada pelo homem do CRS e levanta seu vestido até os seios, enquanto a comprime contra a barra de pole dance. Quando finalmente se despede, deixa o ambiente transformado, casais em êxtase, mulheres que se tocam enquanto os maridos as assistem. Alguns já estão subindo ao terceiro piso.

 

(ELA) Imensa e com pouca roupa, feita de um couro desses que embala a vácuo, a mulher entra feito gata e enrosca-se no pole dance que, até aquele momento, eu não tinha enxergado. Ainda de máscara, passa as mãos em mim, em outras duas moças e em um rapaz. Depois da performance e com o figurino já no chão, a moça vai embora correndo enquanto esconde as vergonhas, em um gesto de timidez e constrangimento que contraria as pernas que, há poucos minutos, pareciam tesouras a cortar o aço em que se deslizava. Despida do personagem, parece não haver sentido de permanência e apressa-se. Para os que assistem, o fim do espetáculo é a deixa para a virada. Depois de um sorteio para ver as moças que mais rebolavam, as ganhadoras recebem uma suíte exclusiva para até seis pessoas e um balde de long necks. O baile de debutantes chega ao fim. O salão começa a esvaziar-se. Passa de uma da madrugada e a festa recomeça, agora, de outro jeito.

 

(ELE) Subimos ao andar superior de mãos dadas e gastamos alguns minutos explorando os espaços. Uma das salas funciona como cinema, algumas cadeiras de plástico voltadas para a projeção de um filme pornô.

 

(ELA) Meu par vai ao banheiro e volta com o aviso: “vem cá, tudo mudou”. Me pega pela mão e refazemos o circuito anterior. O cinema, antes vazio, agora tinha dois casais (devidamente trocados) nus e em movimento, sobre cadeiras de plástico. Um outro par observava.

 

(ELE) O local estava ocupado pelo casal que havia trocado olhares conosco na boate: ele, sentado em uma das cadeiras, se dedicava a uma mulher saltando sobre seu colo; ela, de pé, era envolvida por trás por outro homem. Nós e outro casal observávamos tudo, seus corpos se movendo a menos de 30 centímetros de onde estávamos. Em outro espaço, um corredor ladeado por cabines individuais, casais projetavam seus corpos para fora, pelas portas entreabertas, em busca de voyeurs. Queriam ser vistos. Todos pareciam confortáveis com a própria nudez, estimulados pelos gritos e sussurros dos outros.

 

(ELA) Se no começo da festa tocavam Anitta, Pabllo e alguns sertanejos, no dark room não consigo distinguir qual era a trilha musical. Lembro que o som parecia uma sucessão de aplausos, mas sem o uso das mãos. Além dos gemidos, claro. Nas cabines estreitas e de portas entreabertas, avistei um rapaz com um rosto azulado nas costas, um pássaro, algo imenso que me encarava quando achava que a voyeur seria eu. Enquanto isso, o dono do corpo se diverte com uma morena enorme e escancarada. Ao tentar sair do corredor das cabines, um casal interrompe a passagem. Esperamos e observamos, atentos. 

 

(ELE) Passamos mais de duas duas horas circulando entre o cinema, o corredor de cabines, a sala de sexo coletivo e as duas saunas. Quando percebíamos abertura e interesse do casal, nos detíamos ao seu lado para assistir ao que quisessem nos mostrar. Geralmente mostravam tudo. Ainda descemos à boate para conferir o movimento, mas agora toda animação se concentrava no andar superior. Já passava das cinco da madrugada quando decidimos ir embora. Enquanto esperávamos nosso Uber na calçada, víamos os companheiros de swing se despedindo em seus carrões de luxo. 

 

(ELA) Da janela, vemos alguns grupos saírem do local em carros importados. Dançarinos e meio cambaleantes, talvez estiquem a festa em outro local. Vou para casa quando quase amanhece. Para ver tudo aquilo, bastou ter olhos. Depois, lembro da escritora famosa no facebook: não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.

 

REGRINHAS BÁSICAS

1. Antes de sair de casa, o casal deve estar de acordo sobre o que pode e o que não pode ser feito.

2. A união deve ser madura e o ideal é que o casal não esteja passando por um momento de instabilidade. swing não salva o casamento de ninguém.

3. Na maioria dos ambientes, é aceita apenas a entrada de casais. Se você é homem, não deve entrar acompanhado de uma amiga ou garota de programa. 

4. O que acontece no swing nunca deve ser comentado em outro ambiente.

5. O anonimato é bastante apreciado.

6. A abordagem deve ser sutil. Como em qualquer ambiente saudável de paquera, um “não” deve ser encarado como um “não”. 

7. O voyeurismo é uma prática bem-vinda. Ninguém deve obrigá-lo a participar se não for de seu interesse.

8. Controle seus ciúmes. Se alguém der em cima de seu (sua) parceiro (a) - o que é completamente aceitável -, saiba como reagir. 

9. Ao ver seu parceiro (a) com outra (o), não fique falando ou insistindo em coisas que eles deveriam fazer. 

10. Cuidado com copos e garrafas de vidro. Algumas pessoas podem gostar de se divertir no chão. 

11. Não esqueça de usar camisinha.

 

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