Logo O POVO+
#Lacração. A palavra que saiu do armário
DOM

#Lacração. A palavra que saiu do armário

Edição Impressa
Tipo Notícia
NULL (Foto: )
Foto: NULL

[FOTO1]
Não é novidade que o universo LGBT tem um vocabulário próprio e crescente de termos pra lá de únicos. Poderia citar vários, mas “lacração” pontuou, ou melhor, lacrou o ano que termina logo adiante. Conseguiu até sair do armário e fazer moda entre os não tão familiarizados com o universo gay. Porém, engana-se quem limita a lacração ao simples ato de “mandar bem”. O lacre é primo do “arrasou” e inimigo mortal do “mitou”. Há um quê de lantejoulas salpicadas; tem ranço de hipocrisia e deve ser falado com a boca transbordando. Lacração é tombo, é hino e é voz, que, nem sempre, milita; mas obrigatoriamente causa, ora pela coragem de usar aquele vestidinho desaforado, ora por bradar um “Fora Temer” em ambiente hostil.

[SAIBAMAIS]
O Carnaval de Fortaleza nos mostrou, principalmente em 2017, que é porta-voz da lacração. Blocos independentes reacenderam a ousadia da festa, exibindo fantasias engenhosas e cheias de purpurina. Destacando o nu e o fazendo pertencente, o Carnaval de Fortaleza tornou-se um microuniverso de pequenos lacres este ano, dando uma “voadora” na esfera que quis erguer a bandeira da maledicência. Literalmente foi um carnaval que colocou o corpo pra jogo. E é disso que se trata a lacração: está mais para o “deslacre” do que para o lacre. Liberta, ousa, age sem medo; defronta o preconceito e fecunda novos estilo. Tão óbvio: a lacração é substantivo feminino; gay, bi, trans, colorido e plural. É a celulite da Anitta no clipe Vai Malandra e, principalmente, são as mais de 60 milhões de visualizações do vídeo no Youtube, jogando na nossa cara a sem-vergonhice malandra que deveria nos caber mais vezes.


Assim como Anitta, sua parceira no clipe Sua Cara, a drag queen Pablo Vittar, nos deu uma pequena aula de lacração este ano. Em uma participação especial no Rock in Rio, em meados de outubro, a drag e seu rebolado frenético incendiaram o público. Mesmo com uma voz tecnicamente questionável, Pablo fez uma apresentação histórica. O cabelão fake e o corpo finamente encaixado num maiô cavadíssimo foram ovacionados por um público sedento, que via no palco um pouco de si em meio a um festival de música que claramente tendia ao oposto do “cara” de botas estreladas e agudo inconfundível. O público queria a petulância de Pablo e quem não quis teve que suportar esse lacre inevitável.


Que 2018 nos traga mais lacres, porque sim, necessitamos! Precisamos de mais gordas usando as roupas que as fazem felizes, de menos gente chata questionando seu batom escuro à luz do dia.

Precisamos de mais bateção de cabelo e menos fotos com edição.

Queremos roupas que saiam do óbvio, sem medo dos dedos indicadores malvados. Precisamos no libertar, curtir, gozar, não fingir, gritar, tirar o sutiã cansado, usar a camiseta ao contrário. Lacração é emancipação, amor próprio e não ter medo de ser feliz, simplesmente, sendo.


DICIONÁRIO

 


la·cra·ção
substantivo feminino


1. Ato ou efeito de lacrar, tampar, impedir.
2. Ato de colocar um lacre em algo.
3. Arrasar com tudo, impressionar.

Por Renata Viana

O que você achou desse conteúdo?