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Debate. Fechamento da exposição Queermuseu estimula debate sobre o que é arte
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Debate. Fechamento da exposição Queermuseu estimula debate sobre o que é arte

Em semana pautada por divisão de opiniões a respeito do fechamento da exposição Queermuseu, o País resolveu discutir o que é ou não arte
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Desde o último domingo, 10, quando a exposição Queermuseu – cartografias da diferença na arte da brasileira foi fechada pelo Santander Cultural em Porto Alegre, os limites entre arte e liberdade de expressão vêm pautando debates País afora. A discussão, porém, pouco tem se preocupado em dar protagonismo ao fazer artístico, e, sim, vem sendo um trampolim para reafirmar posições políticas e sociais. É o que aponta Rodrigo Cássio Oliveira, doutor em Estética e Filosofia da Arte pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).


Para o pesquisador, o cancelamento da mostra com temática de sexualidade e gênero não foi uma consequência direta do tipo de arte que ela exibia, mas da “falta de apreço pela liberdade de expressão” — que, segundo ele, vem ganhando espaço na sociedade brasileira. “Houve uma mobilização de natureza essencialmente política e que não enfatizou a possibilidade de um tipo de acordo que fizesse valer a liberdade de expressão, como, por exemplo, pensar classificação indicativa de idade para a Queermuseu”, destaca, apontando que o debate estético e ético sobre as obras se diluiu em extremismos entre o conservadorismo e o progressismo. “O caso todo foi resolvido com o fechamento e isso trouxe à tona toda essa polarização”, resume.


Curadora da galeria Sem Título Arte, em Fortaleza, Jacqueline Medeiros defende que o ocorrido em Porto Alegre não deve balizar as escolhas artísticas dos espaços para as artes no País. “O que norteia a escolha das obras é a proposta de quem está apresentando, porque o que essa proposta vai impactar no público tem muito mais a ver com a formação desse público para a arte”, afirma, ponderando, por outro lado, ser preciso refletir sobre os diferentes perfis que visitam as mostras. “É uma função dos espaços de arte ter esse cuidado de como apresentar as propostas”. Ela cita que no caso de visitas escolares em mostras com obras com sexo e nudez é preciso buscar aliar a visitação a um diálogo direto com educadores para que escola e galeria pensem juntos como será esse contato com os trabalhos.


Outros casos

Nos últimos meses, as diferentes linguagens artísticas vêm sendo atravessadas por questões de ordem política e social. Rodrigo Cássio Oliveira, que é também professor da Universidade Federal de Goiás, aponta que essa situação de “pouca compreensão e intolerância” vem ocorrendo tanto nas alas à direita como nas à esquerda. O pesquisador cita o caso do festival de cinema Cine PE em maio deste ano, que foi adiado após cineastas promoveram boicote ao evento. A motivação: produções consideradas “alinhadas à direita conservadora” seriam exibidos na mostra. “Vejo essa polarização intensiva como um extremo”, reflete.

 

Já em junho, outro caso. O ator Maikon K foi preso em frente ao Museu Nacional da República, em Brasília, enquanto apresentava a performance DNA de DAN, que continha cenas de nudez. Em resposta, o festival Cena Contemporânea — que já preparava grande ação envolvendo corpo nu no ambiente urbano — convidou Maikon para a programação e o artista voltou ao Distrito Federal para, enfim, apresentar sua obra. “A gente vem observando o aumento do conservadorismo em todas as escalas da sociedade e, na mesma intensidade, vem testemunhando um avanço dos direitos sociais e do discurso a respeito das chamadas minorias”, contrapõe Diego Ponce de Leon, coordenador pedagógico e curador do Cena. Ele articulou uma grande foto de nudez artística no último mês que envolveu 115 pessoas e repercutiu internacionalmente.


Sobre o caso do Santander Cultural, Diego assinala que tem sido uma possibilidade de analisar discursos sobre arte e liberdade de expressão. “O debate está acontecendo. É uma pena que o banco (Santander) tenha sucumbido à pressão da opressão, mas está tendo um debate enorme no País sobre o que é e o que não é arte” avança. “O que eu temo é que os dois lados fiquem cada vez mais seguros da própria posição e não haja nenhum espaço para a flexibilidade. Enquanto existir diálogo a gente segue adiante, o problema é quando esse diálogo se transforma em monólogo absoluto. Aí a gente tem um real problema, porque não se escuta mais”.


Repercussões


Acusada de desrespeitar signos religiosos e de jogar luz sobre temas polêmicos como infância e homossexualidade, a mostra repercutiu em muitas frentes. Um abaixo-assinado pediu o retorno da obra; um convite surgiu para a mostra ser reaberta em Belo Horizonte; a página na rede social tumblr chamada Criança Viada foi excluída após acusação de “pedofilia”. Esses foram só alguns dos desdobramentos. Teve ainda suspeita de que o Museu de Arte de São Paulo (Masp) estaria censurando obras; e a Polícia, em Campo Grande, apreendeu quadro em exposição após denúncia de deputados alegando incentivo à pedofilia.

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