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Manfredo Araújo de Oliveira: "Balanço trágico"
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Manfredo Araújo de Oliveira: "Balanço trágico"

Edição Impressa
Tipo Notícia Por

Manfredo Araújo de Oliveira

manfredo.oliveira2012@gmail.com

Professor de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC)


Quando se olha o que marca a orientação de fundo que rege as políticas do governo da nação no último ano, é possível prever um impacto violento na vida do povo. Em artigo recente, L. G. Belluzzo afirma que “os ‘mercados’ e seus lacaios homiziados nos meios de comunicação lideram o poder sem freios em sua escalada para subjugar a sociedade”. Os governantes revelam para ele em suas atitudes que estão avassalados pelo poder do dinheiro e embriagados por doses maciças da ideologia que defende ardentemente a eficiência dos mercados na condução do processos econômicos. Isso explica o ataque recorrente ao Estado em prerrogativas essenciais de sua ação como a cobrança de impostos dos ricos e a administração da moeda com independência da hegemonia dos mercados. O que se vê é que os próprios governantes e seus funcionários não têm constrangimento em violar a lei para, justificam, superar a crise e fazer justiça.


A exigência fundamental da hegemonia dos mercados é o corte dos direitos sociais e econômicos dos cidadãos, porque isto constitui gastos inaceitáveis ao progresso econômico, isto é, à acumulação de capital. Por isso, todo o conjunto de políticas se implanta na busca de “modernização”, um nome bonito para uma forma selvagem de acumulação que elimina os passos civilizatórios já conquistados na efetivação de direitos. Neste sentido é que se pode falar com razão da destruição do sistema de proteção estabelecido para impedir o sofrimento dos mais fracos, vítimas da violência impessoal dos mercados.

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Daí o desmonte radical de tudo o que no passado significou positivação de direitos. O primeiro exemplo é a Reforma Trabalhista que, sem muita percepção de muitos, desmontou a CLT que, por muitas décadas, regulamentou as relações de trabalho. Como lembra G. Boulos, “nem a ditadura militar, em duas décadas, colocou suas garras na legislação trabalhista”. As medidas são dramáticas: o trabalho intermitente, a anteposição da negociação entre empregadores e empregados à proteção legal, a terceirização ilimitada, a limitação do poder de recorrer à Justiça do Trabalho em virtude de entraves burocráticos.


As políticas implementadas significam também um ataque profundo à Constituição de 1988, que assegurou uma rede de proteção social com a garantia de serviços públicos universais por meio de seu modelo de seguridade social composto pela Previdência e pelo SUS e pelo estabelecimento como direito da educação pública e gratuita para todos. A PEC 55 determinou o congelamento dos investimentos sociais do Estado nos próximos 20 anos. Se isso verdadeiramente vingar, eliminam-se os serviços públicos universais e os programas sociais que já começaram a ser suspensos. Isso significa trocar a educação e a saúde do povo pelo crescimento econômico que, para muitos analistas, cada vez mais se tem revelado uma miragem.


Solidariedade, algo tão esquecido neste contexto, significa, diz o papa Francisco, “pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns... É fazer face aos efeitos destruidores do império do dinheiro...”.

 

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