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Festival de canines. O cinema nos tempos de streaming
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Festival de canines. O cinema nos tempos de streaming

Cultura: Com dois filmes da Netflix selecionados para competir no Festival de Cannes, uma polêmica se instalou entre produtores e distribuidores: streaming é cinema?
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Maior empresa de streaming – forma de transmissão de dados de áudio e vídeo através da Internet –, a Netflix vem desde 2015 apostando cada vez mais em bancar a produção e distribuição de filmes, após o sucesso de suas séries (House of Cards) e documentários (Virunga). Com cerca de 40 longas de ficção no acervo exclusivo e projeto de lançar mais 22 no futuro, a empresa é vista com desconfiança pela indústria cinematográfica por conta do modo que disponibiliza filmes: apenas pela plataforma online, pulando a estreia comercial em salas de cinema. A seleção de dois filmes da Netflix na competição do 70º Festival de Cannes abre um novo capítulo dessa discussão.
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Okja, de Bong Joon Ho, e The Meyerowitz Stories, de Noah Baumbach, disputarão a Palma de Ouro, prêmio mais importante do Festival, e têm distribuição garantida na plataforma online da Netflix ainda em 2017, inclusive em território francês. Desde abril, quando o diretor-geral do evento, Thierry Frémaux, anunciou a presença dessas produções, a discussão em torno do streaming esquentou na França. A “carreira” de um filme, como ensina Samantha Capdeville, pesquisadora e professora de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Ceará, costuma começar por festivais, passa por lançamento comercial, chega aos serviços de streaming e, então, às exibições nos canais fechados e depois abertos – o “esquema Netflix” altera essa linha. Para Samantha, a polêmica está grande por mexer, em especial, com o esquema de distribuição. “O streaming nesse formato apresenta uma ameaça a distribuidores e exibidores, uma vez que ele ‘pula’ a janela principal de exibição e não demonstra interesse, ou necessidade, de seguir a trajetória comercial de TV paga e aberta”, explica.
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Não por acaso, a principal reação contrária à seleção veio da Federação de Cinemas Franceses, que representa proprietários e operadores de salas de cinema no País – na França, vale lembrar, a lei do audiovisual estabelece que uma obra só pode chegar às plataformas de streaming três anos depois da estreia comercial, o que seria desrespeitado pela Netflix. Em nota, a Federação lembra a falta de pagamento por parte da empresa de impostos demandados pela lei francesa e ainda questiona a “natureza cinematográfica” dos filmes caso eles não estreiem comercialmente. Como forma de evitar maiores desgastes, a Netflix chegou a estudar o lançamento comercial limitado na França, mas esbarrou na pressão das entidades cinematográficas do País.
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Em resposta às críticas, a organização do Festival de Cannes lamentou não ter conseguido um acordo com a empresa para o lançamento tradicional e criou uma nova regra que vale a partir de 2018: os filmes que competirem em Cannes devem se comprometer a ter distribuição posterior nas salas francesas. A medida barra a possibilidade da Netflix participar novamente do Festival caso não reveja sua linha de lançamento. O presidente da companhia, Reed Hastings, chegou a escrever nas redes sociais que as distribuidoras haviam se unido para “impedir” a presença da Netflix em Cannes.


Para Samantha Capdeville, a empresa traz retornos positivos à indústria, mas também pode estimular a concentração da cadeia produtiva. “A evolução do streaming está provocando uma crise comercial. É aceita a coexistência das diversas formas de se consumir filmes desde que esta aconteça obedecendo a uma lógica de complementação”, introduz. “No caso da Netflix, com produções próprias, ela absorve toda a cadeia produtiva e comercial do filme na medida em que cria (ou compra direitos autorais), financia, produz e exibe sem a necessidade do distribuidor ou agentes de venda. Se por um lado é ótimo ter novos investidores, por outro temos toda a cadeia produtiva em uma única mão”, contrapõe. “Há que se tomarem medidas mínimas de proteção de mercado, sobretudo para a permanência das salas de cinema. Há também que se discutir o modelo de distribuição e exibição, onde apenas critérios comerciais determinam onde e por quanto tempo um filme ficará em cartaz”, finaliza.

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