Antes que a noite se estenda
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Antes que a noite se estenda

2018-10-14 00:00:00

Enquanto o contraditório não for considerado crime de lesa-pátria, é preciso aproveitar os últimos raios de luz da democracia para deixar o testemunho às futuras gerações sobre os prenúncios dos tempos bárbaros que se aproximam. Caso se confirmem, elas já estarão, certamente, experimentando seu amargor. Em primeiro lugar, deixar claro que o resultado destas eleições foi pré-fabricado, como entende grande parte dos analistas. Ele seria outro, com todas as probabilidades, se a candidatura Lula não tivesse sido indeferida ilegalmente (à custa de uma farsa jurídica, segundo a denúncia de mais de uma centena de juristas nacionais e estrangeiros) e o entendimento da própria ONU. O ex-presidente era líder inconteste das pesquisas eleitorais, até enquanto elas não foram impedidas, arbitrariamente, de mencioná-lo. Lula, assim, terá todo o direito - assim como seu partido - de reivindicar, perante a História, a vitória já no 1º turno, que lhe foi sonegada quando os donos tradicionais do poder não aceitaram a possibilidade da 5ª derrota consecutiva nas urnas. Não é inédito: a democracia sempre foi tratada pela Casa Grande como uma "moradora de favor" (aquela sujeita a ser despejada à menor explosão de mau humor do proprietário).

 

O PT, por seu turno, elegeu a maior bancada da Câmara dos Deputados, confirmando que, onde não funcionou a máquina de fake news, as mentes ficaram livres para decidir. Se a eleição tivesse sido democrática, provavelmente os petistas teriam formado uma bancada ainda maior, no rastro da recondução incontornável de seu líder ao Palácio do Planalto. O fato é que a democracia foi jogada no lixo pela parte majoritária da classe dominante brasileira (banqueiros, empresários, ruralistas, e setores da grande mídia) e pelo sistema de justiça (juízes, procuradores, polícia federal) - não todos, evidentemente - segundo a constatação corrente no meio jurídico democrático. Esse pessoal que apostou todas suas fichas no fascismo (cuja ascensão foi fabricada pelo direito de exceção e pela rede difamatória de fake news), deverá ser cobrado, historicamente, por tudo o que acontecer de trágico no Brasil, de agora em diante.

 

Outra forma de reagir a esses fatos foi o apoio "crítico" do PDT ao Haddad. Cada um sabe onde lhe aperta o calo. Os pedetistas preferem esperar pela candidatura de Ciro Gomes, em 2022. Direito seu. Apenas gostaria de lembrar que JK (Juscelino Kubistchek) também confiou, depois do golpe de 64, que seria candidato em 1965. Foi devorado, junto com a democracia.

 

Passemos agora a outras facetas não menos incômodas da realidade factual: esta semana a comunidade científica descobriu, durante um painel sobre a mudança climática, que os cálculos feitos pelo Acordo de Paris, três anos atrás, para evitar que o Apocalipse natural se iniciasse quando a crescente temperatura do planeta chegasse a 2ºC, eram por demais otimistas. Na verdade, o ponto crítico já ocorrerá quando a temperatura se aproximar de 1,5ºC. O que já está muito perto. Secas implacáveis devastarão a biodiversidade, inundações incontroláveis atingirão áreas antes inalcançáveis, furacões, ciclones se espalharão pelo planeta, para só falar apenas de alguns desastres. Assim os projetos de remodelação do modelo de produção, já instalado ou ainda a se instalar (para impedir de se chegar a esse ponto crítico), têm de ser acelerados para conter a corrida ao abismo. Segundo Hans Joachim Schellnhuber, um dos maiores estudiosos do clima, é possível evitar, tecnicamente, a ultrapassagem do ponto de não-retorno, se houver uma descarbonização das economias, a partir de agora, e o convencimento de que uma nova revolução industrial e agrícola, voltada para a sustentabilidade, é imperativa.

 

O grande capital, contudo, resiste a fazer a adequação. Considera muito altos os custos da iniciativa. Acontece que não há alternativas: é preciso correr contra o tempo e convencer governos, empresários e financistas de que é burrice não ajustar os passos ao cronograma do desastre. Mesmo porque é possível lucrar ainda mais ao se fazer essa remodelagem. Informações sobre como atua o clima foram obtidas com o estudo do fenômeno El Ninõ que, ciclicamente, impede a formação de nuvens de chuva na região Nordeste, provocando estiagem. Prevê-se uma nova incidência dele no final deste ano e início de 2019. Está engatilhado o sétimo ano consecutivo de seca. A depender de quem vença as eleições, os sertanejos poderão contar ou não com a rede de proteção social criada pelos governos petistas.

 

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