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Eleição sem Lula é fraude

2017-12-24 00:00:00

 
Ao entenderem que – além do uso da exceção contra Lula – está em jogo o futuro da democracia brasileira e da soberania popular, centenas de intelectuais lançaram, esta semana, o manifesto “Eleição sem Lula é fraude”. A lista é encabeçada por várias personalidades estrangeiras e nacionais, como o Prêmio Nobel da Paz, Adolfo Esquivel, o linguista e filósofo norte-americano Noam Chomsky, o cantor e compositor Chico Buarque, o economista Luiz Carlos Bresser Pereira, o embaixador e ex-ministro Celso Amorim, o escritor Raduan Nassar, o teólogo Leonardo Boff, dentre outros. “A tentativa de marcar em tempo recorde para o dia 24 de janeiro a data do julgamento em segunda instância do processo de Lula nada tem de legalidade. Trata-se de um puro ato de perseguição da liderança política mais popular do país” – alerta o manifesto (https://bit.do/dYmSS).


DESESPERO


A raiz dessa tentativa desesperada de tirar Lula da corrida presidencial à custa do “tapetão judiciário” (como qualificam seus defensores), atropelando prazos processuais e sacrificando a imagem de isenção que deve pairar sobre a Justiça, estaria na recusa dos segmentos privilegiados em abrir mão de um pouco de seus ganhos para permitir, aos que nada têm, um mínimo de participação na renda nacional, tal como vinha ocorrendo durante o período de vigência do programa sociodesenvolvimentista e inclusivo aprovado pelas urnas, em 2002, e iniciado por Lula (e que pode ser retomado se ele voltar ao governo, como apontam as pesquisas). Eis a razão do alvoroço.

IMPRUDÊNCIA


Independentemente de se gostar ou não de Lula, o realismo político exigiria a compreensão de que a instabilidade do País persistirá indefinidamente se uma liderança tão entranhada e legitimada pela sociedade for retirada do jogo eleitoral, a partir de pífias acusações apresentadas até agora contra ele. Diante do que já foi reunido pelos investigadores contra a cúpula do governo – inclusive Michel Temer – e a cúpula tucana - Aécio Neves, José Serra, Aloysio Nunes e até Geraldo Alkmin (livres, leves e soltos) – torna-se ridículo o libelo da Lava Jato contra o ex-presidente, como é comentário geral nos meios informados, tanto nacionais como estrangeiros. Prevalece a nítida impressão de seletividade contra Lula, como já vem sendo denunciado desde o início das acusações pela defesa e, mesmo, por personalidades não-alinhadas com os polos políticos em disputa.

INSTABILIDADE


Tem-se como certo entre os críticos que qualquer governo resultante do impedimento artificial da candidatura do líder absoluto das pesquisas pré-eleitorais, na corrida presidencial, além de ser um desrespeito à soberania popular, seria a senha para a inviabilização da democracia no País (a segunda parte do golpe), pois o ocupante do Palácio do Planalto cujo mandato for obtido a esse custo, sempre terá a legitimidade contestada, o que colocará o País na categoria dos “inconfiáveis” para quem pretende investir com segurança seu capital, pois estará sobre um barril de pólvora. Seria extremamente grave não levar em conta, num assunto como esse, a vontade manifestada pela maioria dos cidadãos eleitores. Sobretudo, diante de procedimentos processuais polêmicos e de elementos probatórios frágeis e inconvincentes, na visão de vários juristas. Seria apostar no precipício. Ninguém nega a soberania popular (que é a fonte de legitimidade do poder político) em vão – alertam essas vozes. Seria atirar o País numa instabilidade sem fim. A Nação não merece isso.

RECOSTURA


Depois de tudo o que passou na história republicana do Brasil, marcada por curtos intervalos democráticos entre um estado de exceção e outro, já seria hora de as classes dominantes brasileiras deixarem a eterna conspiração contra a democracia. Foi essa contrariedade com a livre expressão da vontade popular (sob a alegação de que o povo brasileiro não sabe votar) que atrasou a entrada do País na contemporaneidade e sabotou seu projeto de Nação. As amarras que garrotearam o País se deveram à mesquinhez e mediocridade de suas elites econômicas e suas lideranças políticas, ditas “conservadoras” e “liberais”. Nestes tempos de Natal, é salutar pedir que essa camada privilegiada largue um pouco seus interesses particularistas e pense em reconstituir, mais uma vez, o Estado Democrático de Direito, avariado por mais um golpe de estado, para assim refazer a unidade da Nação e abrir-lhe nova oportunidade de autoafirmação, através do veredicto das urnas. Com Lula retirado, malandramente, da disputa eleitoral, isso não será possível – afirmam os que conhecem a história do Brasil e a do mundo.

NATAL


É uma pena que assunto tão amargo tenha de ser trazido num momento em que, idealmente, só deveriam ser abordados temas amenos. Porém, o Natal cristão é encarnado, não tem apenas o apelo simbólico à paz e harmonia entre os homens, num mundo cada vez mais embrutecido pela desumanização, ódio, pobreza e desigualdade. Mas, deve ensejar também a solidariedade e a reparação de injustiças. E, também, a reflexão de indivíduos e sociedades inteiras sobre as razões desse processo antidemocrático que leva à exclusão, por meios “heterodoxos”, de quem não se alinha com o sistema dominante e resiste a aceitar a marginalização de segmentos inteiros da sociedade que não tiveram oportunidades iguais de acesso ao banquete da vida.

NOEL SELETIVO


O fato é que frente à realidade do Brasil atual, assiste-se a um Natal extremamente seletivo. Só quem não tem queixa do Papai Noel são os bancos e seus lucros estrondosos, os rentistas, as multinacionais do petróleo (que receberam de bandeja o pré-sal brasileiro e o desmonte da Petrobras como empresa estratégica), o agronegócio, que foi liberado para abocanhar mais reservas florestais; os empresários do pato amarelo (que fizeram as relações trabalhistas retrocederem ao século XIX), e os fazendeiros escravistas que viram abolida a Lei Áurea. Bem como os testas-de-ferro parlamentares que subordinaram o Congresso Nacional aos interesses de segmentos predatórios e antinacionais. Feliz Natal.


AVISO 


O JORNALISTA FÁBIO CAMPOS ESTÁ DE FÉRIAS E VOLTA A ESCREVER A COLUNA NA EDIÇÃO DE 14 DE JANEIRO.

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