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Natação, literatura, psicanálise
Foto de Socorro Acioli
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Escritora e jornalista com doutorado em estudos da literatura pela Universidade Federal Fluminense. Ganhou o Prêmio Jabuti, na categoria de Literatura Infantil com o livro

Natação, literatura, psicanálise


Decidi ler Ulysses. Uma série de coincidências me levaram até ele e agora é inevitável. Depois de terminar esse texto, irei a uma livraria, comprarei a tradução do Caetano Galindo e esse será um dos presentes de aniversário que darei a mim mesma. Tenho a versão digital, mas acho que Ulysses merece uma relação mais orgânica. Vou escolher um marcador bonito, conviver com o livro como um monumento, sempre perto de mim em lugares diferentes da casa, por longos meses.


Tenho uma boa lista de livros não lidos e isso me deixa contente. Gosto muito de uma frase do escritor francês Jules Renard: “quando penso nos livros que ainda vou ler, tenho a certeza de ainda ser feliz”. Na categoria das leituras por prazer, prefiro que os livros cheguem na hora certa a forçar uma leitura para dar satisfação aos outros. Que outros? Se alguém começa uma conversa literária baseada na disputa sobre quem leu mais e melhor, eu saio à francesa. Isso é tão bobo! Literatura pra mim é outra coisa muito maior que ego. É oxigênio.


Costumo organizar minhas leituras mês a mês. Levo minhas metas bem a sério, igual aos vendedores da Renner, cobrando reação de mim mesma. Aproveito todo espaço livre para ler. Tempo sobrando ninguém tem, mas é possível arrumar uma janela todos os dias para respirar. Eu respiro melhor quando estou lendo. Para uma asmática essa metáfora significa muito.

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Então, vou ler Ulysses. A decisão foi tomada por causa de um capítulo do Formas Breves, do escritor e crítico literário argentino Ricardo Piglia. Ele fala de James Joyce, de sua angústia com a doença da filha, Lúcia, que também escrevia. O pai orgulhoso e preocupado decidiu levar os textos de Lúcia para a análise de Carl Gustav Jung e diz que ela escreve igual a ele. Jung discorda com uma sentença: no oceano onde você nada, ela se afoga.


O genial Piglia toma essa frase para dizer que a psicanálise e a literatura tem muito a ver com a natação, se tomarmos a linguagem como um mar aberto. E segue afirmando que a literatura deve muito à psicanálise, que levou James Joyce a experimentar uma nova forma de narrar, fora da tradição literária. Quando perguntavam a Joyce sua relação com Freud ele respondia: “Joyce em alemão é Freud”.


Jung e Lacan escreveram sobre Ulysses, que tornou-se um tema frequente entre os estudiosos da psicanálise. Estou lendo alguns textos, pegando informações sobre as traduções para o português, descobrindo resenhas. Sinto como se estivesse fazendo as malas, organizando os detalhes para uma viagem. E vai ser. Um livro dessa envergadura exige preparação.


Ulysses vai me acompanhar ao longo desse ano, pouco a pouco, no passo lento que ele merece. A psicanalista Maria Anita Carneiro Ribeiro tem uma aula sobre Joyce e Lacan no YouTube, onde ela diz que é um livro muito divertido, um dos preferidos da sua vida. Tomara que eu concorde. Se você não leu Ulysses, pode ser uma boa ideia me fazer companhia. Vai valer a pena.

Foto do Socorro Acioli

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