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Canção dos trópicos
Foto de Socorro Acioli
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Escritora e jornalista com doutorado em estudos da literatura pela Universidade Federal Fluminense. Ganhou o Prêmio Jabuti, na categoria de Literatura Infantil com o livro

Canção dos trópicos


Vinte anos depois de seu lançamento, chega ao mercado uma nova edição, revista e ampliada, do livro Verdade Tropical, de Caetano Veloso. É um volume robusto, com mais de quinhentas páginas. Ao contrário do que parece, não é exatamente uma biografia do cantor. É, na verdade, uma reflexão profunda sobre o que foi o nascimento do Tropicalismo e o projeto artístico e coletivo iniciado por Caetano, determinante para os rumos da história da música popular no Brasil.


A palavra verdade do título já anuncia a intenção de esclarecer o que ficou mal explicado pelo caminho, além de aprofundar o olhar para as raízes e influências do movimento organizado em um momento importante da música popular brasileira. As questões pessoais estão no livro em lugar secundário. Aparecem quando fazem parte de um contexto e são sempre fundamentadas no pensamento, na reflexão e na consciência, como parte de um todo, de um modo de vida. Verdade Tropical é, sobretudo, uma obra sobre ideias e sobre palavras. A palavra, essa sim, é a musa do livro.


Caetano Veloso é um leitor refinado. Seus autores favoritos aparecem em Verdade Tropical assumindo seus lugares na formação desse letrista profícuo. O vasto repertório de leituras vai da literatura, passa pela sociologia, filosofia e ciência política. Edgar Morin, por exemplo, ocupa posição importante no campo de suas ideias sobre cultura. Elegeu Borges como seu autor latinoamericano preferido e não gostou tanto assim de Cem Anos de Solidão. Leu Cabrera Infante e conheceu o autor. Também aprecia a obra de Vargas Llosa, Drummond, Bandeira, João Cabral, Clarice Lispector e tantos outros.


Gosta de Proust e escreve parecido com ele no estilo, no tamanho das frases e na fartura de palavras ao desenvolver um pensamento. Por muitas vezes, inclusive, Caetano pensou que não seguiria a carreira de cantor e compositor. Seus planos originais passavam pelo desejo de ser professor, escritor ou cineasta. Ler Verdade Tropical desperta a curiosidade sobre qual seria o resultado da aventura de escrever um romance, como fez Chico Buarque.


É uma pergunta que eu gostaria de fazer a Caetano Veloso. E que eu teria feito quando estive com ele semana passada, se a emoção provocada por seu abraço não me tivesse deixado sem fala. Fui ao encontro de Caetano levada por Moreno, seu filho, depois do show lindo que os quatro, Caetano, Moreno, Zeca e Tom, fizeram em Fortaleza. Um teatro lotado, emocionado, aplaudiu a celebração daquela família.


A leitura de Verdade Tropical sedimenta essa celebração, faz entender que a construção da trajetória artística de Caetano amplia nossa consciência de nação. A música brasileira contemporânea mudou absurdamente, mas Caetano permanece nela, reinventando sua base e acolhendo o novo. Seguimos com ele, no calor dos trópicos, ainda e sempre tentando entender quem somos nós, os brasileiros.


Foto do Socorro Acioli

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