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O país Lobato
Foto de Socorro Acioli
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Escritora e jornalista com doutorado em estudos da literatura pela Universidade Federal Fluminense. Ganhou o Prêmio Jabuti, na categoria de Literatura Infantil com o livro

O país Lobato

 

Na dúvida, recorra ao mestre. É o que faço sempre. Nos momentos de incerteza, decisões a tomar, pergunto a quem entende do assunto, por experiência ou estudo. Foi assim quando comecei a escrever literatura infantil. Achei que era algo sério demais para tentar às cegas e decidi fazer um mestrado sobre o tema.

 

O projeto de pesquisa era uma análise aprofundada sobre a obra de Monteiro Lobato e seu projeto de formação de leitores, sua maravilhosa enciclopédia literária. Percorri todos os livros da obra infantil lobatiana procurando os modos de ler, as leituras que despertavam a aventura, o envolvimento dos leitores ficcionais com as obras, a presença dos clássicos. É no mínimo impressionante o que esse gênio conseguiu fazer em vinte e quatro anos dedicado à escrita para crianças.


Lobato acreditava no poder da leitura como formadora de mentalidades. Partia da própria experiência de leitor, de suas memórias de leitura para analisar as suas escolhas e tornar-se mais consciente do seu trabalho.


Dentre todas as atitudes pioneiras de Monteiro Lobato em diversos setores de sua atuação, a mais inovadora foi inserir a imaginação nas histórias para crianças. Parece paradoxal: a infância é o tempo do imaginar, mas quem lida com meninas e meninos muitas vezes esquece disso.


Lobato nunca esqueceu a leitura de Robinson Crusoé. Isso significava, para ele, que os livros da infância deveriam ser bons o suficiente para merecerem a presença na memória de um leitor por toda a sua vida, como formadores de consciência, sobretudo.


Se um autor de literatura infantil enxerga de forma clara as memórias da sua infância, se durante o processo de criação ele evoca a criança que foi, certamente conseguirá emprestar à sua escrita uma voz infantil sincera, facilmente reconhecida por seus leitores em formação.


Para Antonio Candido “O nosso amor pelos contos infantis, depois de adultos, é uma espécie de procura (...) duma posição inefável de simplicidade, em que as alegrias mais simples não fossem desperdiçadas pelo mal de pensar e de viver. Uma saudade não se sabe bem de quê, procurada em vão.”


As preocupações de Lobato não ficaram restritas aos conteúdos transmitidos, mas sim a uma postura do leitor frente aos textos. Como seria essa forma ideal de leitura? E como Lobato resolveu o problema de ensinar às crianças como se deve ler? As práticas de leitura de Lobato certamente foram para ele o parâmetro do que seria uma forma ideal de ler: vivenciando os textos.


Ele permitia que os textos modificassem sua vida e consciência. As leituras não estavam presentes somente na escritura de Lobato, como uma influência por vezes identificável. Ele praticava o exercício de dialogar sobre os textos lidos, através das cartas com amigos e outros escritores, convertendo leitura em escrita, como um caminho natural.


Se todo autor deve ser um grande leitor, antes de tudo, no caso da criação de livros infantis a exigência deve ser redobrada. Além disso, quem pretende escrever para crianças precisa estar certo de que ainda lembra da própria infância e se ainda tem o dom de imaginar. Já existem muitos livros chatos no mundo.


Cada vez mais, as crianças precisam de livros para sonhar e despertar novos caminhos. Isso é só um pouco do que Lobato ensinou. Sua frase “um país se faz com homens e livros” foi copiada, pintada nos muros, repetida, decorada, mas ainda não aconteceu. A esperança está na infância.


Foto do Socorro Acioli

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