Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)
Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)
Também não é justificável atribuir o ocorrido a uma suposta retaliação da Polícia contra a covarde execução de três policiais militares na Vila Manuel Sátiro. A PM cearense é capaz de atuar com bastante eficiência em situações assim, sem que precise recorrer a expedientes bárbaros. Isso tanto é verdade que os suspeitos do crime foram identificados e presos horas depois do atentado.
Participei de uma pesquisa em que PMs afirmaram ter se valido do uso da tortura como forma de obter informações, haja vista a incapacidade de que a Polícia Civil teria de investigar. Internamente, tal prática é conhecida como "trabalho". Um deles me disse, em tom de desabafo, que a investigação não avança se o acusado não for "trabalhado". Como se vê, a tortura policial não é simplesmente um episódio isolado, mas um método.
Não creio que essa seja a realidade da imensa maioria dos PMs do
Estado do Ceará, mas práticas de tortura policial como a veiculada na semana passada mancham a imagem da corporação como um todo. Diante da gravidade do ocorrido, o Comando da PM e a Controladoria Geral de Disciplina (CGD) já se manifestaram publicamente repudiando o ato.
Há, no entanto, quem lucre politicamente com uma polícia violenta. Vivemos tempos de populismo na segurança pública e isso se expressa em discursos e pronunciamentos que sempre buscam a solução mais simples e mais ineficaz para a questão da insegurança pública: ações ainda mais violentas. Apostar no sentimento de vingança e na exacerbação da violência policial é apostar no caos. É preciso ter mais responsabilidade com as vidas alheias, inclusive com as vidas dos próprios policiais.
Não se apoia a polícia chancelando torturas e práticas ilegais no interior da corporação, mas sim cobrando melhores condições de trabalho e investimentos em uma política de segurança mais abrangente, que saia do binômio "compra de equipamentos/aumento do efetivo". A criminalidade não vai se acabar somente com a presença de homens fardados e equipados nas ruas. Quem diz isso é uma pessoa insuspeita, ninguém menos que o comandante do Exército Brasileiro, o general Eduardo Villas Bôas.
Após seis meses de intervenção federal no Rio de Janeiro, o general Villas Bôas fez o seguinte balanço: "O componente militar é, aparentemente, o único a engajar-se na missão. Exigem-se soluções de curto prazo, contudo nenhum outro setor dos governos locais empenhou-se com base em medidas socioeconômicas para modificar os baixos índices de desenvolvimento humano, o que mantém o ambiente propício à proliferação da violência".
O Governo do Ceará assinou recentemente o Pacto Federativo para a Prevenção e Combate à Tortura que prevê o cumprimento de três compromissos: a instalação do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura por meio de uma lei; a instalação do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, também por lei; e a elaboração de um Plano Estadual. Trata-se da oportunidade perfeita para o governador Camilo Santana se pronunciar sobre o caso, anunciando uma série de medidas concretas tomadas por sua gestão contra esse tipo de prática. Os bons policiais e a sociedade agradecem.
P.S. Embora a coluna desta semana tenha se detido mais especificamente na tortura cometida por policiais militares, não se trata de uma prática restrita à PM. Diversas denúncias de tortura, maus tratos e racismo institucional são dirigidas à Guarda Municipal de Fortaleza (GMF), em especial aos efetivos que se localizam nos terminais de ônibus. Assim como ocorre com a polícia, não se trata apenas de desvios individuais, mas de um método que deve ser banido.
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