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O relógio contra a reforma

2017-12-08 01:30:00
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O governo Michel Temer (PMDB) usa todo seu capital político e muito do capital financeiro — no caso, o Orçamento da União - para tentar aprovar a reforma da Previdência. O prazo original era a última terça-feira, 6. Foi adiado para a próxima, dia 12. Agora, de novo, para a terça seguinte, 18. O novo prazo é apenas uma esperança. Nada indica que o governo terá votos até lá. Mais uma semana de adiamento e será Natal.


O PREÇO DO ESFORÇO


Quando se forma uma onda e os deputados percebem que ficarão para trás, eles aderem. Foi assim que o impeachment de Dilma Rousseff (PT) foi aprovado. A dificuldade do Palácio do Planalto é criar e tornar visível essa tendência.


Esforço não tem faltado — com o dinheiro alheio, é verdade. O Estado de S.Paulo informou ontem que o governo já comprometeu R$ 43,2 bilhões nos próximos anos, em busca de apoio. Dinheiro com renúncias fiscais, perdão e renegociação de dívidas e liberação de verbas. Entre técnicos do governo, existe avaliação de que Temer cedeu antes de hora.


Há receio de que o ajuste fiscal seja comprometido. Na verdade, nem sei que ajuste é esse. Não houve ajuste de verdade (em outubro, economistas ligados a instituições financeiras estimaram que o rombo deste ano seria menor: passaram a projeção de R$ 159 bilhões para R$ 158,43 bilhões). O risco que está colocado é de o governo estourar ainda mais os gastos e ainda fracassar na votação da reforma.


A intenção é mudar a Constituição, com o argumento de equilibrar as contas públicas. Para fazer isso, o governo está comprometendo ainda mais os gastos. Pior ainda: o Planalto entrega à vista com promessa de receber apoio futuro. Porém, a mercadoria passa longe de estar garantida.


O esforço do governo se deve ao calendário. Se a votação não começar neste ano, virá o recesso e o assunto será retomado no ano eleitoral. Perde-se muito do trabalho, digamos, de convencimento. Os deputados estarão perto das bases, mais suscetíveis à pressão dos eleitores. Mais perto da campanha. Quem não quer se desgastar agora dificilmente terá essa disposição em fevereiro.


A chance que o governo tem é de muitos deputados estarem fazendo jogo para extrair tanto quanto puderem, mas já dispostos a votar a reforma da Previdência. Estarem apenas “se fazendo de difíceis”, de modo a levar mais. É bem capaz de ser isso mesmo.


Aprovar em primeira votação ainda este ano talvez seja a etapa mais difícil, mas não será a última. Em tese, quem já tiver se desgastado uma vez dará o prejuízo por precificado e, então, ficará a favor também nas votações subsequentes. Todavia, o recesso será tempo para sindicatos espalharem fotos dos “traidores”, que terão votado “contra as aposentadorias dos trabalhadores”. A virada de votos pode tornar duvidoso o que era certo.


Depois disso, haverá nova votação no Senado. Embora aliado estratégico de Temer, Eunício Oliveira (PMDB) demonstra dúvidas sobre as perspectivas da apreciação na Câmara. “A matéria está na Câmara. Eu não posso pautar uma matéria que não está aqui. Enquanto a Câmara não votar, eu não tenho nem sequer como pensar em pauta-la, não posso discutir quando ela vai ser ou não votada. Não sei nem se a Câmara vai votar”, afirmou.

 

O governo já moveu mundos na busca de votos e precisará remexer muito mais para ter sucesso em seu intento.

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CARGOS COMO MOEDA


Na tentativa de aprovar a reforma, o governo periga evidenciar um de seus movimentos mais atabalhoados. Deputados que votaram contra o Planalto perderam cargos que estavam com indicados no governo. Agora, há perspectiva de devolução dos postos. Como seria óbvio entender, os parlamentares retaliados no passado estão ressentidos e não querem ajudar Temer. O movimento, que se propunha muito esperto, foi desastrado. A possível solução, com devolução dos cargos, seria a mais descarada barganha. O mais explícito toma lá, dá cá.

Adriano Nogueira

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