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Quem ganha e quem perde com a permanência de Temer

2017-08-03 01:30:00

Com o perdão por dizer o óbvio, o presidente Michel Temer (PMDB) é quem mais ganha. Ele e seu governo todo, claro. Ganha, sobretudo, porque a derrota representaria sua derrocada. Dele e dos aliados mais próximos, vários dos quais são investigados na Lava Jato e perderiam foro privilegiado.


Como o julgamento seria no Supremo Tribunal Federal (STF), não haveria a certeza de que seu afastamento seria definitivo. É diferente do que ocorre num processo de impeachment no Congresso Nacional, quando o presidente afastado tem chances próximas de zero de retornar. Mesmo assim, ele ficaria muito fragilizado, perderia a caneta, o controle da máquina e dos cargos, mesmo temporariamente. Ele já é impopular e o eventual retorno ocorreria às vésperas da eleição. Politicamente, estaria reduzido a praticamente nada, mesmo eventualmente absolvido no STF.


Então, Temer ganhou com o resultado porque, em caso de derrota, ele estaria destruído. Mas ele sai enfraquecido na derrota. Foram 263 votos, apenas sete a mais que a metade dos 512 deputados. Faltaram 45 para o número mínimo para aprovar uma emenda constitucional. Mais que duas bancadas inteiras do Ceará.


FUTURO DAS REFORMAS

De modo que, com o resultado de ontem, as reformas saem enfraquecidas. Sobretudo a da Previdência. A maneira mais simples de promover mudança constitucional tão impopular seria colocar na função alguém como Rodrigo Maia (DEM-RJ). Chegaria sem o peso da impopularidade e do desgaste. Ideologicamente, tem muito mais compromisso com essa pauta do que Temer — que, afinal de contas, era vice de Dilma e não tem compromisso com nada além da própria manutenção no poder. O fraco governo peemedebista tem um ano até a eleição para recompor sua base e aprovar a reforma mais difícil. No meio do caminho, deve enfrentar outra denúncia já engatilhada pela Procuradoria Geral da República (PGR). Problema que não haveria com Maia. Se as reformas empacarem — ou assim permanecerem, pois empacadas já estão — a razão para isso provavelmente poderá ser encontrada na votação de ontem.

 

DESCONFIANÇA SOBRE O PRESIDENTE DA CÂMARA

Rodrigo Maia saiu desse processo sob desconfiança no Palácio. Quando a situação do presidente ficou pior, o sucessor imediato passou a se movimentar de forma ambígua. Teve encontros nos quais supostamente articulou o pós-Temer. Além disso, passou a assediar deputados para levar ao DEM, na tentativa de se fortalecer politicamente. Não é visto como aliado propriamente confiável para o governo.

PSDB ENTRE IDAS E VINDAS

O PSDB sai enfraquecido e sem rumo. O líder orientou voto contra Temer, mas o relatório contrário à denúncia, aprovado ontem, foi de um deputado tucano. A bancada rachou e alguns decidiram não comparecer. Agora, o partido está assim: dividido, não sai do governo, mas orienta voto para derrubá-lo. Mantém cargos por enquanto, mas outros partidos naturalmente estão de olho. Os principais líderes não se entendem. Quanto mais fica nesse impopular governo, mais se desgasta. Terá candidato no ano que vem e não sabe se fica ao lado de Temer até o fim. Mas, se for romper, fará isso quando? No fim das contas, periga ser posto para fora antes de se resolver a sair. Uma bagunça e uma trapalhada.

 

CENÁRIO PARA O PT

Para o PT, paradoxal que seja, a permanência de Temer é boa politicamente. O segundo governo de Dilma Rousseff (PT) foi para o partido uma sangria desatada. A ex-presidente já havia sido reeleita pela menor margem jamais registrada. No ano e meio seguinte em que ela ficou no mandato, os índices de aprovação do governo, do PT e do Lula chegaram aos piores patamares desde que os petistas se tornaram força política relevante. A partir do momento em que Temer tomou posse, o peemedebista ficou mais impopular a cada 15 minutos, enquanto Lula gradualmente se recuperou nas pesquisas. A rejeição dele ainda é a maior entre todos os candidatos, mas a aprovação cresceu. Nesse período o noticiário negativo permaneceu contra o PT, contra Dilma e o próprio Lula. Porém, eles deixaram de ser o alvo principal das atenções da opinião pública. Rei morto, rei posto, reza o adágio. Quem está no poder atrai a atenção da opinião pública.

Temer faz isso como ninguém e com agenda quase permanentemente negativa. Ninguém ficou convencido da inocência, as boas notícias na economia até têm surgido, mas não contrabalançam as medidas impopulares que têm sido usadas com esse fim. O prometido equilíbrio fiscal, pelo qual tantos deputados votaram ontem, não ocorreu. O presidente é, hoje, o maior cabo eleitoral de Lula.

 

Érico Firmo

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