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Onde as medidas impopulares apertam

2017-08-10 01:30:00
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O presidente Michel Temer (PMDB) por vezes é incapaz de manter de noite o que disse de manhã. Na terça-feira, ele havia dito que há estudos sendo feitos pela equipe econômica para aumentar a alíquota do Imposto de Renda, embora não houvesse decisão tomada sobre o assunto. A notícia pegou muito mal em vários setores e, diante da repercussão negativa, o presidente disse que a medida, mesmo em estudo, não será tomada.


“A Presidência da República não encaminhará proposta de elevação do Imposto de Renda ao Congresso Nacional”, disse o presidente, em nota, na noite do mesmo dia no qual havia mencionado os estudos. A nota justificou que Temer apenas fez “menção genérica” aos estudos, o que é verdade. Ocorre que, do dia para a noite, ele descartou esses estudos, não se sabe se com acesso a eles ou não. Chama atenção a volatilidade.

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Em evento na manhã de ontem, Temer voltou a mencionar as notícias sobre aumento de imposto: “Não é verdade, não haverá aumento. Absolutamente, não haverá”. Da maneira que ele fala, parece até que o assunto foi inventado do nada. Ele próprio, todavia, havia colocado a questão. Depois, trata como se fosse invenção da cabeça de alguém.


E o que mais chama atenção é quão suscetível o governo é a algumas críticas, enquanto ignora outras tantas.


A TRIBUTAÇÃO SOBRE QUEM GANHA MAIS

Pelo que vazou dos estudos de que falou o presidente, um deles se referia à criação de uma nova alíquota de Imposto de Renda para quem ganha acima de R$ 20 mil. Esses segmentos pagariam entre 30% e 35% de Imposto de Renda. A medida mexeria em pessoas com salários superiores a 20 salários mínimos. Em bom português: gente rica.

A grita foi geral. Reclamaram a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), até a Central Única dos Trabalhadores (CUT), essa última talvez no afã de criticar qualquer medida que parta do governo.


Não faz muito tempo, o setor representado pela CNI chegou a ver vantagem na impopularidade de Temer. Dizia-se que, devido à falta de aprovação popular, ele não ficaria tentado a agradar a população e, assim, estaria livre para adotar medidas impopulares. Seria o caso da nova alíquota do Imposto de Renda.


Ocorre que o presidente pode até não se sentir pressionado ao tomar medidas que afetem a população. Mas, se mostra vulnerável quando decisões afetam os que ganham mais. Medida impopular é boa quando mexe com os outros.


TRIBUTO SOBRE A RENDA E SOBRE O CONSUMO

Qualquer vestibulando de economia sabe a vantagem da tributação sobre a renda em relação aos impostos sobre o consumo. Arrecadar proporcionalmente a quanto se ganha é instrumento de justiça social. Tributar o consumo, pelo contrário, aprofunda as desigualdades. Quando compra um quilo de feijão, o Eike Batista no tempo em que era bilionário ou pedreiro pagam rigorosamente o mesmo imposto. Proporcionalmente, o pedreiro está sendo muito mais tributado. Esse é o modelo fiscal brasileiro, de justiça às avessas.

Imposto sobre consumo ainda encarece os produtos, inibe a comercialização, desestimula a circulação de dinheiro, desaquece a economia. Tributar conforme a renda e com mais peso sobre os mais ricos ajudaria a deixar menos desequilibrada essa balança. Claro, o ideal era que o consumo fosse proporcionalmente desonerado. Mas, o governo matou a ideia no nascedouro. Enquanto isso, já adotou a pior forma de tributação sobre o consumo, encarecendo combustíveis, que repercutem em toda a cadeia produtiva e invariavelmente chegam ao consumidor final, direta e indiretamente.


Não à toa, esse modelo se tornou a forma preferencial de financiamento do Estado brasileiro. Tributar o consumo é a forma mais fácil e rápida de arrecadar. Sem falar que atinge sobretudo o andar de baixo, com menos poder de pressão e cuja voz é menos ouvida.


OS PERIGOS DA LEI E O RUMO DA BAGUNÇA URBANA

A nova Lei de Uso e Ocupação do Solo se mostra bastante favorável a quem violou regras de construção e que passará a ter oportunidade de se regularizar. Na prática, em muitas coisas incentiva a ocupação desordenada e predatória do espaço, uma das pragas de Fortaleza.

Para solucionar a existência de tantas intervenções fora da lei, serão criados mecanismos mais simples para que a irregularidade seja “anistiada” pela lei. Regredimos.

Érico Firmo

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