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A "pirangagem" nas políticas de segurança

2017-07-26 01:30:00

Os assim chamados “pirangueiros” se tornaram figuras recorrentes no linguajar dos gestores que tratam das políticas de segurança pública no Ceará. Num curto espaço de tempo, todavia, a forma como são abordados mudou. Em 28 de abril do ano passado, o discurso era de que muitos dos que eram considerados membros de facções criminosas seriam apenas pequenos delinquentes, sem representar grande risco. Isso em meio a dezenas de atentados contra delegacias, prédios públicos, empresas de telefonia, ônibus, além de ameaças de bomba na Assembleia Legislativa e no Fórum Clóvis Beviláqua.


“Qualquer pirangueiro que joga uma pedra no vidro da janela de uma delegacia, por exemplo, já é considerado o novo Al Capone. Aí, chega no presídio como se fosse um bandido de extrema periculosidade”, ironizava o então secretário da Segurança Pública, Delci Teixeira.


Um ano e três meses passados, a gestão estadual volta a falar de tais personagens, mas em outra perspectiva. “Não basta prender os pirangueiros que estão nas ruas”, disse o governador Camilo Santana (PT), no último sábado. Ele anunciou investimentos na Polícia Civil e responsabilizou o conflito entre facções criminosas pelo aumento da violência. Quanta diferença.


Antes, o suposto crime organizado era na verdade alguém que não representava grande perigo e que tinha rebolado uma pedra. Agora, as facções são problema grave. A mudança de discurso mostra que o Estado pode ter dormido no ponto.


Na coluna de 29 de abril de 2016, um dia após O POVO publicar a declaração de Delci, escrevi: “Espero que esteja mesmo havendo exagero. Caso sejam só ‘pirangueiros’ agindo, mas se o Estado estiver preparado para lidar com bandidos perigosos, estará tudo bem. O problema é se o governo estiver pronto apenas para enfrentar pirangueiros, e se deparar com criminosos organizados”.


Pouco mais de um ano depois, a presença das facções é inequívoca dentro dos presídios, com ações cada dia mais ousadas do lado de fora. Delci teve mérito de reduzir o número de homicídios pela primeira vez em mais de década, mas a insistência em minimizar a presença do crime organizado talvez tenha permitido que o perigo se tornasse maior ainda. Essa é a crise que estourou nas mãos de André Costa.


CAMINHO CERTO

O linguajar segue inapropriado, fortalecedor de estigma. Mas, a postura adotada por Camilo agora tem seu acerto. Há mais de uma década, a política de segurança do Ceará tem a Polícia Militar como centro. Já o contingente da Polícia Civil é, proporcionalmente, o menor do Brasil. É o setor responsável pelas investigações, pela inteligência. Só se previne violência em larga escala, não se combate crime organizado com Polícia Militar. Há muito tempo, o Ceará aposta na presença ostensiva de policiais como caminho para conter a insegurança. É muito caro e não funcionou.

Nunca se prendeu tanta gente. Porém, muitos dos presos são responsáveis por pequenos delitos, traficantes que estão na ponta. Sem relevância ou importância estratégica, são facilmente substituídos, sem prejuízo para a cadeia do crime. Eles são a maioria dos que superlotam os presídios. Foi gasto muito dinheiro na prisão de pessoas, e mais ainda para mantê-los presos, sem que essas detenções tenham resultado efetivo em reduzir a criminalidade, a violência.


Para ler o que Delci Teixeira falou sobre “pirangueiros”, acesse este link: http://bit.ly/pirangueiros


Para ler o que escrevi a respeito do assunto, leia o último tópico deste link: http://bit.ly/pirangueiros2


Para ler sobre a fala de Camilo a respeito do assunto, acesse:

http://bit.ly/pirangueiros3


POVO, ESSE INCONVENIENTE

“Eleições podem impor retrocesso às reformas”, publicou nesta semana o jornal Valor Econômico.

Ora, ora, ora. Reformas que não foram referendadas nas urnas podem ser atrapalhadas porque o País é uma democracia e elege seus governantes. O povo não foi chamado para opinar antes e, agora que se aproxima esse desagradável negócio de eleição, ainda pode atrapalhar. Talvez porque a população jamais concordou com as propostas.


Argumentam “especialistas”, as reformas são importantes. Quem decidiu isso? Quem julgou que as medidas são necessárias? Quem são os iluminados aptos a estabelecer isso sem ouvir a população? Por que pode ser um problema ouvir o povo sobre os rumos do País que pertence a esse povo?


Na democracia, a única maneira de escolher as políticas públicas e os caminhos a serem adotados pelos governos é ouvindo o povo. O mais é autoritarismo.

 

Érico Firmo

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