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O Ceará no meio da crise política

2017-06-14 01:30:00
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Se Brasília está com os nervos à flor da pele ante a expectativa de uma denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB), a guerra aberta entre Legislativo e Judiciário e a ameaça de rompimento entre PSDB e PMDB, o Ceará não vive dias mais tranquilos. Investigações se desdobram e atingem importantes personagens locais, com capacidade para alterar decisivamente o quadro da disputa eleitoral de 2018, embaralhando as já cartas postas na mesa e criando ainda mais indefinição sobre o futuro.

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Pelo menos dois ex-governadores do Estado foram citados em delações firmadas no âmbito da Operação Lava Jato. Cid Gomes (PDT) é acusado por Wesley Batista, um dos donos da JBS, de receber propina de R$ 20 milhões para liberar créditos de ICMS devidos à empresa quando era chefe do Executivo - parte desse dinheiro teria ido parar na campanha de 2014 ao Governo do Ceará. Lúcio Alcântara (PR) foi mencionado por um dos executivos da Odebrecht como beneficiário de propina durante a construção do açude Castanhão quando era governante. Ambos negam qualquer conduta irregular, mas os estragos estão aí.


O pedetista é padrinho político de Camilo Santana (PT), pré-candidato à reeleição. Lúcio, do deputado estadual Capitão Wagner, também do PR, potencial adversário do governador - o outro fiador de Wagner, Eunício Oliveira (PMDB), também está enrolado, com inquérito aberto contra ele na esteira da lista do Janot, aquele pergaminho contendo 83 nomes de autoridades listadas no Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, conhecido como o “setor de propinas”.

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Consideradas essas dificuldades, que só tendem a se agravar à medida que a Lava Jato avança e cria tentáculos nas esferas estaduais, é possível que, ano que vem, o petista e o republicano se encontrem nas urnas, sim, mas sem a companhia embaraçosa de alguns aliados. Nesse cenário, Camilo e Wagner estarão melhores sozinhos do que acompanhados.


Não por acaso, há duas semanas, o governador e o deputado lançaram-se com mais ousadia nas redes sociais, onde buscam consolidar-se como nomes de olho no pleito que se avizinha. Desse modo, Camilo e Wagner antecipam movimentos estratégicos e se desvencilham de seus apoiadores chamuscados por investigações - o chefe do Executivo tenta, além disso, fixar uma marca que o distinga do antecessor, cujo legado de obras controversas (Acquario, ponte estaiada e compra de tatuzões) tem sido questionado. Daí a aposta na educação e, mais recentemente, na segurança sob viés oposto ao de Cid Gomes, responsável pela criação da Ronda do Quarteirão (Camilo tem investido na expansão do Raio, que, simbolicamente, ainda goza de prestígio entre camadas populares).


De quebra, os adversários políticos estreitam relação com uma ferramenta que, segundo pesquisa do Ibope, tem grande poder de influência na definição dos votos. Assim, feitos os cálculos e somados prós e contras, quem estiver na mira da Lava Jato em 2018 estará marcado com uma letra escarlate. Será, então, uma presença tóxica, ainda que a operação tenha cometido excessos.


Com a classe política seriamente comprometida diante das investigações e a opinião pública implacável com gestores suspeitos de se beneficiarem desses esquemas, as eleições de 2018 serão uma mistura de corrida maluca com show de calouros - realizadas sob regras novas, ainda não testadas em pleito para governador e presidente, atravessadas pelas primeiras ações penais que chegarão ao Supremo Tribunal Federal (STF) e com amplo espaço para experimentação, tanto de estratégias quanto de personagens, o que pode representar também um risco para o eleitor.

 

Henrique Araújo

Jornalista, editor-adjunto de Conjuntura do O POVO

Escreve esta coluna interinamente de terça a sábado

 

Adriano Nogueira

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