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Os atentados e a estratégia política

2017-04-22 01:30:00

 

A crise da segurança pública em Fortaleza, desencadeada em série de atentados, marcou ponto de inflexão no debate político entre o governador do Estado e seu mais popular opositor. Desde a campanha eleitoral de 2014, Camilo Santana (PT) sempre evitou bater de frente de forma mais direta com Capitão Wagner (PR). Não faltaram ataques ao deputado, mas partiram principalmente de Ciro Gomes (PDT). Da parte do Capitão, ele vinha há alguns meses em busca de discurso para confrontar o governo. A nomeação de André Costa para secretário da Segurança Pública desarmou o discurso de Wagner. O novo gestor age e fala de forma a agradar a categoria na qual o deputado tem reduto eleitoral e militância. O deputado vinha no equilibrismo entre criticar a segurança sem poder falar do secretário que se tornou querido nas corporações policiais.


Na quinta-feira, Wagner ensaiou um discurso possível. “Não dá para ter um secretário de Segurança valente com um Governo frouxo, não. O secretário de Segurança pode ser um super-homem que sozinho não vai sanar os problemas de segurança do Estado do Ceará”.


Camilo acusou o golpe: “Isso é coisa de moleque, eu acho que se aproveitar do momento pra querer tirar vantagem política, infelizmente eu não vou entrar nesse jogo”. O governador não havia desqualificado nenhum crítico, nenhum opositor em termos tão duros. A gestão Camilo atravessou sua semana mais delicada até aqui - e olha que não faltaram crises nas mais diversas áreas, da saúde à economia, passando pela seca. A série de atentados é marco não só de postura inacreditavelmente atrevida da criminalidade, mas também de aumento em alguns graus da temperatura política.


ATRAVÉS DO ESPELHO

Detalhe a respeito da fala do Capitão Wagner sobre o clima de terror que se instalou na Cidade: a última vez que Fortaleza passou por dias de tanto medo e tão atribulados foi na greve dos policiais na virada de 2011 para 2012. Naquela ocasião, Wagner era o principal líder do movimento.

ENCAMINHAMENTOS DO PT

A confirmação de Acrísio Sena como novo presidente do PT em Fortaleza deve desencadear série de movimentos dentro do partido que merecem ser acompanhados de perto. O mais importante a ser observado diz respeito à administração Roberto Cláudio (PDT) e, com isso, o grupo Ferreira Gomes inteiro. O PT municipal, até então sob hegemonia do grupo da ex-prefeita Luizianne Lins, apoiou o governo Cid Gomes (PDT) desde a eleição, em 2006, até 2012. O rompimento partiu dos aliados de Cid, justamente para que lançassem Roberto Cláudio a prefeito. Esse foi o fator para se afastarem e é o ponto mais crítico na relação entre as forças.

Pela forma como o PT funciona, a reaproximação não vai acontecer da noite para o dia nem será abrupta. Porém, o obstáculo que havia na interlocução entre o partido e o grupo Ferreira Gomes se transforma em ponte. A própria relação com o governo Camilo Santana, do próprio partido, fica desobstruída. O que não significa que deixará de haver resistências internas. O grupo de Luizianne segue forte e expressivo. A derrota foi por impressionantes três votos.


O CUIDADOSO E METICULOSO MACHADO

Um dos detalhes mais fascinantes das delações premiadas é ver corruptos contarem, com riqueza de detalhes e sem pudores, como engendravam o roubo ao patrimônio público. É curioso como, a partir de certo ponto, eles deixam de demonstrar qualquer vergonha. Talvez na intenção de convencer os investigadores da relevância e gravidade do que narram, eles chegam a revelar alguma empolgação, até, com o crime que cometeram. Um toque de fascínio com aquilo de que foram capazes.

Chamou-me atenção o relato de Fernando Reis, ex-executivo da Odebrecht. Ele conta sobre as reuniões com o cearense Sergio Machado, então presidente da Transpetro. De tudo que vi sobre a Lava Jato, ninguém se revelou tão metódico e cuidadoso quanto o ex-senador. Aliás, esse é seu estilo desde os tempos em que foi o todo-poderoso secretário de Governo, no primeiro mandato de Tasso Jereissati, entre 1987 e 1991.

 

Reis revela que, nas reuniões para tratar de propina, a secretária recolhia todos os telefones celulares. O encontro ocorria numa sala com isolamento acústico, no décimo andar do prédio da Transpetro, no centro do Rio de Janeiro. Durante a conversa, a música era mantida alta. Machado temia gravações. Ele viria a se notabilizar na Lava Jato pelas gravações com personagens como Romero Jucá (PMDB-RR), Renan Calheiros (PMDB-AL) e José Sarney (PMDB-AP). Sabia o potencial de estrago daquilo que queria evitar.

 

Érico Firmo

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