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Para além do caixa dois

2017-03-04 01:30:00
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Quando políticos aparecem em listas de doações fraudulentas, costumam reagir de duas maneiras. Se o dinheiro está fora da prestação de contas, dizem que tal pagamento nunca existiu. Ocorre que pode ter havido sim, no clássico caixa dois. Por outro lado, se a quantia está na contabilidade oficial, a explicação passa a ser que tudo foi feito dentro da estrita legalidade. O que também não é necessariamente verdade.


A Lava Jato tem explicitado muitos esquemas de pagamentos fraudulentos que estão dentro da contabilidade oficial. Os recursos são declarados à Justiça Eleitoral. O problema é a motivação: propina em troca de favorecimentos em obras ou serviços públicos. Caixa dois costuma ocorrer quando as campanhas recebem recursos desviados ilicitamente ou verbas movimentadas ilegalmente pelas empresas doadoras. No caso, da Lava Jato, a maior parte do dinheiro era parte oficial do caixa das empresas, pagas formalmente a título de doações.


O problema era que as doações eram contrapartida por contratos escusos com os governos, numa relação na qual políticos se valiam de tráfico de influência para obter verba. Como moeda de troca, a entrega de contratos estatais, ou a expectativa de obtê-los.


Havia os pagamentos obscuros, como o pacote que teria sido entregue a José Yunes, supostamente a pedido de Michel Temer (PMDB). Nem tudo era feito a luz do dia, mas muita coisa ocorria fora das sombras. Havia capa de legalidade sobre os negócios mais obscuros da República.


Argumentar que a doação está na prestação de contas se assemelha à postura de gestores públicos que, quando denunciados por irregularidades, alegam que os gastos foram aprovados nos tribunais de contas. Como se fosse rotina as cortes reprovarem algo, mesmo quando muito escabroso.


ELEITO RECLAMA DE QUEM ELEGEU

Discussão sobre a crise política na Assembleia Legislativa, na manhã de ontem, enveredou por caminho curioso. O deputado Ely Aguiar (PSDC) comentou que o eleitor também tem culpa pelos escândalos. Chamou atenção para a má qualidade dos políticos que o povo elege. “Tem que procurar qualificar melhor aquelas pessoas que vão lhe representar”, cobrou Aguiar (foto), em seu terceiro mandato na Assembleia.
[FOTO1]

Alguns colegas dele reforçaram. “O eleitorado brasileiro é mais corrupto, tornou-se delinquente”, disse Fernando Hugo (PP), cujo partido tem o maior número de políticos investigados na Lava Jato. “O povo precisa escolher melhor na hora de votar”, reforçou Roberto Mesquita (PSD), que foi vereador e está no segundo mandato de deputado.


Que o eleitor tem culpa por aqueles que elege é óbvio. Porém, há de se dar o desconto de que também não existe uma infinidade de excelentes opções dentre as quais o eleitor pode fazer sua escolha. Sobram dedos na mão para computar os partidos que não foram apanhados na Lava Jato. Vota-se entre aqueles que estão disponíveis.


Além disso, por mais justa que seja a crítica, admira-me que os eleitos por esse voto reclamem de quem votou errado. Se o sujeito vota em alguém esperando determinada postura e o político se revela corrupto, o eleitor é a primeira vítima. Podia ser mais criterioso? Podia, claro. Deveria, aliás. Porém, não vamos confundir as coisas. Se o governante é corrupto, a culpa é do criminoso. Não pode ser terceirizada ao eleitor desavisado.


Já no caso de sabidamente corruptos reincidentes e recorrentemente reeleitos, aí realmente não dá para perdoar o eleitor. Se não se atina nem quando a crítica vem até de quem é votado, aí está mesmo na casa do sem jeito.


PRIMO DE HEITOR EM REUNIÃO DO GOVERNO CAMILO

Semanalmente, grupo de diversos órgãos do Governo do Estado se reúne para analisar a situação hídrica. Ontem, o encontro teve participação do senador pelo Piauí Elmano Férrer (PMDB). Natural de Lavras da Mangabeira, Elmano é primo do deputado estadual Heitor Férrer (PSB), opositor do governo Camilo Santana (PT). No início deste ano, ele deixou o PTB e se filiou ao PMDB, legenda de outro opositor de Camilo, o senador Eunício Oliveira. Os três, Elmano, Heitor e Eunício, nasceram em Lavras.

Elmano estava no encontro para conhecer a política cearense de convivência com a estiagem — referência há décadas.

Érico Firmo

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