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Significados da escolha do secretário

2017-02-01 01:30:00

Érico Firmo

Jornalista, editor-executivo do núcleo de Cotidiano do O POVO

A escolha de André Costa para secretário da Segurança Pública foi jogada política do governo Camilo Santana (PT), tanto para dentro como para fora. No intervalo de um mês, a medida tem sido até aqui extremamente bem-sucedida para os objetivos do governo. A escolha de um secretário jovem, que vai para a rua junto com os policiais sob seu comando e que faz discurso que agrada em cheio a categoria, estabelece contraponto em relação ao maior opositor do Governo do Estado. André Costa é contraponto em relação ao deputado estadual Capitão Wagner (PR).


Até agora, a categoria tem adorado o discurso. A ideia de escolher entre “Justiça e cemitério” caiu em cheio no gosto dos policiais. Há décadas e décadas um secretário não era tão aprovado pela categoria. Desde, sei lá, Moroni Torgan, no fim dos anos 80? André Costa conseguiu levar os policiais para o lado, se não do governo Camilo, para o da Secretaria da Segurança Pública. Em cinco anos desde que Capitão Wagner se projetou na primeira linha da política estadual, é a mais contundente resposta que Camilo consegue dar ao opositor. Desse ponto de vista, a estratégia é um sucesso.


Porque, até agora, Costa fala mais para dentro que para fora das forças de segurança. Agrada à categoria, está junto dela. Vai para a rua em operações. Segue lição de Alexandre, o grande: não pedir aos seus comandados nem mais nem menos do que o próprio líder faz. Ia para a linha de frente. Ficava com fome quando seus soldados não tinham o que comer. Passava sede com eles quando faltava água. É o estilo de Costa. Fala para o público interno, arregimenta a tropa, o que é algo muito importante.


Para fora, porém, para a população, não é isso que importa. Claro, é bom para o conjunto da sociedade que a Polícia esteja motivada e confie em seu comando. Todavia, o desejável num aparelho de segurança não é que o secretário precise ir para a rua combater a criminalidade. Da mesma forma que não se esperava que Cid Gomes (PDT), quando governador, mergulhasse num tanque para consertar adutora em Itapipoca. O que se espera é que as coisas funcionem de forma que os gestores não precisem se envolver diretamente na ponta das ações. Os papéis são outros. Claro, nada impede que o secretário esteja lado a lado com a tropa e viva o que os policiais vivem. Essa vivência acrescenta muito. Mas, não é o papel fundamental do secretário.


O coronel Francisco Bezerra, não custa lembrar, agia do mesmo jeito. O “pé de boi”, como Cid o apelidou, gostava de participar de operações. Porém, foi sob sua gestão que estourou a greve da Polícia, que a tropa saiu do comando, que os índices de homicídios se tornaram os piores da história. Não basta ir à rua em operações. Muito menos basta fazer discurso. O que irá determinar a relação do secretário com seus comandados serão as políticas para a categoria. No começo, o discurso foi o pior possível, do ponto de vista do interesse público.


A SEGURANÇA NUM GOVERNO DO PT

O que diria o PT se o discurso do “Justiça ou cemitério” tivesse partido de secretário de um governo do DEM ou do PSDB? É inacreditável que o partido, pela primeira vez no Governo do Ceará, assista sem espanto ou reação ao discurso do secretário sobre a naturalidade com que cogita mandar seres humanos - ainda que cometam crime - ao cemitério. Em outros tempos, o partido estaria em polvorosa. Os tempos mudaram.

Até porque a fala do secretário impressiona, mas não surpreende, diante do que já se sabia quando ele chegou ao cargo. O POVO mostrou e você pode ler neste link: https://bit.ly/sspdscosta

 

A gravidade do que disse o secretário foi bem exposta pelo promotor Marcus Renan Palácio, em artigo publicado ontem no O POVO: “Quando uma autoridade de qualquer ramo da atuação do Estado possui visão de que pode responder na mesma moeda ao crime, há graves perversões”. E conclui, de forma magistral: “Lamento ter que vir a público para dizer o óbvio: aplicação da legalidade democrática é nossa esperança. E tolerância e compreensão histórica da criminalidade também. Nunca será nossa esperança a violência: discursiva ou física”. Leia a íntegra neste link: https://bit.ly/marcusrenan


ENFRAQUECIMENTO

Preocupação extra está no contexto em que a fala ocorre. Há sinais de aparente enfraquecimento da Controladoria Geral de Disciplina. A CGD foi talvez a coisa mais positiva que Cid Gomes (PDT) realizou, em meio a monte de erros na área da segurança. Ele deu autonomia e criou modelo inovador. Os policiais não gostam, sentem-se ameaçados. Porém, a existência de controle rigoroso torna a Polícia melhor, estabelece parâmetros para a população, protege a sociedade daqueles que querem se valer da atividade policial e desvirtuá-la. É uma proteção ao que deve ser a Polícia, mecanismo de aperfeiçoamento. Pois essa Controladoria pode estar sendo esvaziada. A controladora, Socorro França, foi retirada da função e remanejada para a Secretaria da Justiça. Isso faz quatro semanas e até hoje está um interino por lá. O rumo que o governo começa a tomar nesse campo é indicativo preocupante sobre o futuro do controle da atividade policial.

 

Adriano Nogueira

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