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Quem queria "estancar sangria" agora pede "suruba" geral

2017-02-22 01:30:00
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A disputa é boa, mas Romero Jucá (PMDB-RR) provavelmente é a personagem mais emblemática do governo Michel Temer (PMDB).


Ao comentar a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) restringir foro privilegiado aos crimes cometidos no exercício do mandato, Jucá afirmou que o mesmo deve valer para membros do Ministério Público e do próprio STF. Então, proferiu uma das pérolas dessa administração: “Se acabar o foro, é para todo mundo. Suruba é suruba. Aí é todo mundo na suruba, não uma suruba selecionada”.


Ele até tem razão. Se o entendimento sobre foro for esse, deve valer para todo mundo. O problema é o momento em que a ideia surge, enquanto Jucá e grande parte do governo, da base aliada e do meio político inteiro estão na mira do STF e do MP. A proposta é justa, mas feita agora soa como ameaça.


Como mais problemática ainda, muito mais, era a ideia de impedir todos os integrantes da linha sucessória da Presidência da República de responderem a crimes anteriores ao mandato. Privilégio do qual já desfruta o presidente seria estendido a presidente da Câmara, presidente do Senado e do STF. Resguardaria assim Rodrigo Maia (DEM-RJ), Eunício Oliveira (PMDB-CE) e Cármen Lúcia. Sobre a última não há denúncias conhecidas. Sobre Maia, inquérito da Polícia Federal, há duas semanas, apontou indícios de corrupção supostamente praticada por ele em favor da empreiteira OAS. Eunício é citado em delações na Lava Jato. Felizmente, a ideia foi abortada pouco depois de tornada pública.


As teses podem até ter fundamento, a primeira em particular. E a defesa de ambas tem sua legitimidade. O problema é o momento em que o debate surge. A primeira fica com aparência de retaliação. A segunda, de blindagem. Em um caso e outro, a aparência de uso da força política com respaldo governamental em nome de se contrapor a investigações.


Jucá foi o primeiro ministro de Temer a cair. Ficou uma semana e meia no cargo. Deixou o Ministério do Planejamento depois que veio a público gravação do diálogo dele com Sergio Machado, feita por este último. Entre outras coisas, falava da necessidade de “estancar a sangria” decorrente da Lava Jato, tirar Dilma Rousseff (PT) para colocar Temer e fazer um “grande acordo nacional”, incluindo o Supremo, para delimitar “onde está, pronto”. Seis meses depois, virou líder de Temer no Congresso Nacional.


ORIGENS

Jucá não é problema nascido no governo Temer. Teve cargo na administração José Sarney (PMDB), no governo Fernando Collor, foi vice-líder do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) no Senado, ministro da Previdência de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), demitido quatro meses depois em meio a denúncias. No ano seguinte, virou líder do governo Lula e exerceu mesma função com Dilma. Todos se valeram, permitiram e alimentaram o estilo de Jucá fazer política.

Alguns falam que é um mal necessário, que para quem quer governar é impossível deixar de fazer composições com esse tipo de político. Pode ser. Só não dá para dizer que não bebeu desta água até se fartar. Não dá para fingir que não tem nada a ver com ele. Nenhum, nem Sarney, nem Collor, nem FHC, nem Lula, nem Dilma pode se eximir da responsabilidade pelo poder que Jucá nunca deixou de ter.


Até porque se pode reclamar de muita coisa de Jucá, mas não há de se questionar sua sinceridade. Em veemente discurso no Senado em defesa de suas iniciativas, na segunda-feira, ele disse: “Vou continuar aqui agindo do jeito que sempre agi”.


É a mais pura verdade. Tem feito isso sempre, servindo a todos os governos. Nada de novo.

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RODA, RODA E VIRA, SOLTA A RODA E VEM

Para deixar ainda melhor a história sobre o foro privilegiado, Romero Jucá ontem explicou que, quando falou de suruba, referia-se à música dos Mamonas Assassinas, Vira-vira. Tem mesmo muito a ver com a política brasileira. Não convém mencionar a maioria dos trechos numa coluna geralmente respeitosa com amoral e os bons costumes. Mas, a música começa assim: “Raios!”

 

Érico Firmo

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