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A guerra do TCM contra a Assemleia

2017-02-18 01:30:00
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Nunca antes na história dos tribunais de contas cearense houve crise tão grave entre as cortes e os poderes Executivo e, principalmente, Legislativo. O Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) é órgão auxiliar da Assembleia, mas vem em confronto mais que aberto. Verdade que os deputados começaram a briga, ao aprovarem a extinção do TCM. Domingos Filho, presidente do Tribunal, vem reagindo e, na quinta-feira, adotou seu ato mais extremo. Partiu para o ataque contra 19 deputados que têm contas sob análise. É quase metade dos 46 parlamentares estaduais. Essa briga vai longe.

 

PAPELÃO

O Prêmio Camões, o mais importante da literatura em língua portuguesa, transformou-se ontem num deprimente espetáculo de um ministro que não sabe seu tamanho nem seu lugar. Raduan Nassar, mais importante autor brasileiro vivo, recebeu o prêmio e desancou o governo Michel Temer (PMDB). Ele era a estrela e o motivo de os convidados estarem ali. Porém, a ordem tradicional da cerimônia foi invertida e, por algum motivo, alguém achou que o ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS), deveria ser o último a falar. O discurso de Nassar contra o governo era previsível. Ficou a impressão de que mudaram a ordem para permitir a Freire responder. Já seria inadequado, mas poderia ter sido feito com alguma elegância. O que se viu, todavia, foi degradante. O ministro discursou debaixo de vaias da plateia e gritos de “fora, Temer”. O homenageado, de 81 anos, foi chamado por Freire de “histriônico”. Um patrimônio da cultura brasileira foi ultrajado por um ministro que se mostrou um desclassificado. Não estava à altura do momento, como bem definiu o poeta Augusto Massi.

Freire (foto) bateu boca com a plateia. Defendeu que o autor deveria ter recusado o prêmio e argumentou, em defesa do caráter democrático da gestão Temer, que o Camões estava sendo entregue a um adversário do governo. O ministro confundiu as coisas. Não foi o Poder Executivo brasileiro quem escolheu o premiado. Foi um júri de literatos de peso. Este ano, pelo Brasil estavam o poeta Sergio Alcides e a crítica literária Flora Sussekind. E não é uma comenda do governo brasileiro, apenas, mas instituída em conjunto com Portugal.

 

Para completar, o Ministério da Cultura divulgou nota na qual lamenta “a prática do Partido dos Trabalhadores em aparelhar órgãos públicos e organizar ataques para tentar desestabilizar o processo democrático”. A estrutura de comunicação da pasta mergulhou na briga partidária.

 

O Camões já foi concedido a nomes com a dimensão de José Saramago, João Cabral de Melo Neto, Rachel de Queiroz, Ferreira Gullar, Miguel Torga, Jorge Amado, Lygia Fagundes Telles, dentre tantos outros. Não merecia ter sido transformado em situação tão degradante.


POR FALAR EM SOMBRAS

O discurso de Nassar foi contundente. Apontou que o Brasil vive tempos “muito sombrios”. Direcionou as principais críticas a Alexandre de Moraes, “figura exótica indicada agora para o Supremo Tribunal Federal”, segundo descreveu. Atribuiu a ele “curriculum mais amplo de truculência”, “incontinência verbal assustadora”. Disse que sua omissão atribuiu os massacres em presídios no Norte.

 

As críticas a Moraes se estenderam a todo o governo, classificado como repressor e contrário a trabalhadores, aposentados, universidades. Sobrou também para o Supremo e para o Senado, a quem, na definição de Nassar, coube consumar o golpe contra Dilma Rousseff (PT), “íntegra, eleita pelo voto popular”.

 

Não admira que Freire não tenha gostado e tenha se preparado para responder. Raduan Nassar fez discurso político, como poderosamente política é sua obra. Não havia de se esperar outra coisa do discurso do homenageado. Obviamente, seria descabida seleção ideológica dos premiados. Diante do que, é de se esperar que haja falas que desagradem ao governo.

 

A resposta também é do jogo, mas no devido momento e oportunidade. Freire poderia até responder, mas não naquele tom e naquela ocasião. Foi inconveniente, para dizer o mínimo. Numa premiação literária, agiu como se estivesse num embate contra adversários partidários no parlamento. Ainda jogou luz extra sobre o protesto que quis rebater. Além de tudo, um trapalhão.

 

 

Érico Firmo

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