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Talento!? (parte 2)
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Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como

Talento!? (parte 2)


(Continuação da coluna do dia 17 de agosto)

Outro assunto que às vezes me vem à cachola é o da originalidade. Sabemos, e acho que a maioria concorda, que pouquíssimos são os artistas realmente originais, que criam algo inteiramente novo. Aparece um, dois em cada cem anos (pessoalmente acho que um pouco mais, levando-se em contas as diversas artes) e passam a ser imitados por séculos e séculos. São os Dante, Camões, Fernando Pessoa, Proust, Faulkner, James Joyce, Virgilia Woolf, Kafka etc. da vida. Pois bem, depois vêm os imitadores, diluidores. Ou será que mesmo um diluidor, imitador, pode chegar a desenvolver melhor do que o criador aquele "tipo novo de arte"? Será que Clarice não foi (sem querer ofender, claro, os claricianistas de carteirinha) uma imitadora do irlandês Joyce? Um amigo diz que ela deve mais a Hermann Hesse. E daí se tiver sido, se ela tiver partido daquela inédita ideia de literatura e pensado, sonhado em cima e conseguido dar sua contribuição pessoal importante, que, mesmo sem ser totalmente inédita, será necessária e terá novos diluidores, que pululam por esse mundão afora. Mas será que o conhecimento humano, a arte em especial, não será uma grande diluição, imitação, continuação; novos pontos de vistas sobre os mesmíssimos caminhos? Quantos de nós, prosadores modernos, não devemos um tiquinho a Kafka, que deveu a Robert Walser, que deveu a... Quantos de vós, pobres contistas modernos, não devem um tantinho a Borges, que deveu a Marcel Schwob... Quantos não devem um neologismozinho que seja a Guimarães Rosa, que deveu a Joyce, que deveu a... Quantos romancistas não devem a Proust, que deveu a Montaigne, que deveu a... Quantos contistas cearenses não devem um tiquinho a Moreira Campos, que deveu a Tchekov, que deveu a... Acho que estaremos sempre tentando subir um degrau, pouquíssimos conseguirão ir além do modelo, do que inventou o "novo". Imagino que, no fundo do fundo, somos todos uns imitadores, uns diluidores. E ainda bem! Mas claro que todos devemos tentar ir além, dar uma contribuição pessoal em sua arte, tentar uma fresta nova na porta, um ângulo nunca antes utilizado, um efeito distorcido na frase, uma sonoridade sugestiva no verso, enfim: ousar encontrar uma voz própria.

 

Também ando matutando sobre se, nós escritores, devemos mesmo ter um estilo próprio, inconfundivelmente pessoal, a ponto de que alguém que nos leia saiba logo de quem se trata. Algo assim como a nossa marca registrada. Alguns grandes autores adquiriram uma maneira de escrever que, de tão peculiar, se tornou inconfundível. Uma crônica de jornal de Clarice Lispector é facilmente reconhecida, mesmo que se omita o nome dela. Um poema de Fernando Pessoa (qual deles?, perguntaria alguém mais atento) poderia não ser tão óbvio. Franz Kafka é outro quase inconfundível em suas parábolas. O alemão W.G. Sebald e o italiano Claudio Magris, para quem conhece minimamente suas obras, também são inconfundíveis. Mas talvez a canadense Alice Munro e a escocesa Ali Smith não sejam tão facilmente descobertas. Dalton Trevisan desenvolveu um tipo de enredo que dificilmente não se descobre de quem é o conto. Rubem Fonseca, idem. José J. Veiga nem se fala...

 

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