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Parque aquático? Que parque aquático?
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Parque aquático? Que parque aquático?

 

Daniela Nogueira

 

“Homem morre em acidente em parque aquático em Aquiraz” – O POVO, segunda-feira, 16 de julho de 2018. “Inauguração do Vainkará reúne famosos no Beach Park neste sábado” – O POVO, sábado, 14 de julho de 2018.

 

Qual é a diferença entre as duas manchetes acima? Até o leitor menos atento perceberá. Uma delas: refere-se ao mesmo local, em situações diferentes. O título da matéria de sábado exibe o nome do local, informando a inauguração do brinquedo batizado de “Vainkará”. Um tom positivo, de exaltação pela estreia da atração. O título da matéria de segunda omite o nome do local, usando o termo genérico “parque aquático”, sobre um acidente, que resultou na morte de um turista dentro do complexo. Um tom negativo, acerca de uma tragédia no maior parque aquático da América Latina.

 

Meu questionamento, durante a semana, nas avaliações internas, se juntou à percepção de vários leitores, que entraram em contato para perguntar o motivo da abordagem diferente: por que, ao noticiar a morte de um turista, usamos “parque aquático”, na manchete do portal do O POVO, e não o nome do Beach Park? Por que usamos o nome “Beach Park” ao noticiar a inauguração do brinquedo no sábado? Qual é a diferença de tratamento jornalístico entre o acidente e a inauguração do badalado brinquedo?

 

Nos títulos das demais matérias e das notícias dos blogs, o genérico “parque aquático” foi usado quando a notícia focava no acidente. Na matéria do jornal impresso, na terça, 17/7, foi chamada na capa: “Após acidente que deixou um homem morto, parque aquático em Aquiraz fecha hoje”. Limitamos a vítima a “um homem” – uma pessoa que já estava identificada. O radialista conhecido como Ricardo Hill, de São Paulo.

 

Tratamentos diferentes

Na matéria interna, “Homem morre em acidente em parque aquático”, só citamos o nome do local do acidente no primeiro parágrafo, ignorando no título. Não procuramos a família da vítima nem amigos. Também não vi questionamentos acerca da segurança do equipamento. Na matéria, não há qualquer menção à ida da reportagem ao local do acidente.

 

Ah, a notícia do acidente não foi divulgada nas redes sociais do O POVO nem esteve na lista de notícias via WhatsApp que o jornal envia. Um modo claramente atípico do O POVO de noticiar a morte de alguém em um ambiente altamente frequentado por cearenses e turistas.

 

Interessante lembrar que, na segunda-feira, 16, o jornal impresso trouxe em meia página a matéria “Beach Park inaugura Vainkará e segue com plano de investimento”. Com foto em três colunas, quadro e depoimentos pomposos acerca do novo brinquedo, o jornal apresentava, com dados explícitos, a estratégia de ampliação da empresa. Um viés positivo para a empresa.

 

A Chefia da Redação enviou em relação aos questionamentos: “É preciso não perder a perspectiva de um ponto: O POVO noticiou, em suas plataformas, o acidente ocorrido no Beach Park na última segunda-feira (16). A edição impressa do dia seguinte circulou com chamada de capa e manchete de página com foto. O Portal fez diversas atualizações e a rádio O POVO/CBN, da mesma forma, noticiou o fato e forneceu material para a CBN nacional. O mesmo aconteceu nos dias seguintes ao acidente. Em nenhum deles deixamos de publicar o nome do empreendimento ou suprimimos informação necessária à compreensão do fato. O Grupo de Comunicação O POVO entende ser de sua responsabilidade editorial, e disso não abre mão, a forma, a intensidade e a plataforma adequadas para a distribuição das notícias que apura.”

 

É óbvio que colocar o nome do local no título da matéria denota um peso negativo muito maior ao empreendimento – a notícia será facilmente achada em sites de busca, e o espaço, por ser tão conhecido, mais facilmente identificado pelo leitor. Não se trata de condenar definitivamente a empresa onde ocorreu o acidente, mas de publicar uma informação das mais básicas à notícia – o onde.

 

Que a empresa encontre o seu modo de gerenciar a crise e expressar as informações, é uma função que cabe a ela e a seus assessores. Um veículo de comunicação, porém, não pode se submeter a isso. A informação de interesse público não deve ser dominada pelo julgamento desigual e escuso do momento. Qualquer interesse que esteja acima da qualidade da informação e da prática da ética é desleal com o leitor.

 

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