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Dois passos para trás
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Dois passos para trás

 

Tânia Alves

 

Há 20 anos, O POVO deixou de ter uma editoria exclusiva de Polícia. A mudança ocorreu quando se tomou consciência que os assuntos deveriam ser tratados como segurança pública, portanto, eram de cidade. As notícias passaram, então, a ser abrigadas junto a conteúdo como saúde, educação, meio ambiente e urbanismo na editoria Cotidiano. A ideia é trabalhar os conteúdos ligados à violência num contexto ampliado com suas causas, efeitos e contextos, para além daquilo que as forças policiais divulgam. É entender que ali, naquele momento, existem vários lados e histórias, que precisam ser contempladas. Em grande parte, hoje, este objetivo é alcançado no noticiário. Mas o processo, às vezes, tropeça em detalhes, e o passado teima em retornar.


Quando se volta às antigas, o leitor estranha e cobra. Recebi, na terça-feira passada (6/6), mensagem relatando este estranhamento sobre detalhes de um crime descrito num ‘Saiba Mais’ indexado à matéria “Corpo de adolescente de 16 anos é encontrado”, publicada em Cotidiano. No quadro do conteúdo, se descrevia como o corpo do rapaz havia sido encontrado. “Chocou-me esse parágrafo. Achei muito cru, direto e desnecessário. Digno daqueles abomináveis programas ‘policiais’”, opinou o leitor.


Ele tinha razão. Não havia necessidade de entrar em detalhes para contar a situação do desespero da família. Para meu espanto, não foi a única vez na semana passada em que o noticiário de segurança nas plataformas do Grupo de Comunicação O POVO extrapolou o limite aceitável entre a narrativa do fato (que existe, ninguém pode negar, e deve ser noticiado) e o exagero na cobertura. Na quinta-feira passada (8/6), ao acessar O POVO Online, no início da manhã, deparei com um conteúdo em destaque principal no portal que me deixou impactada pela imagem editada. A manchete informava: “Suspeito de estupro é amarrado pela população e preso pela PM”. Logo abaixo do título, foi indexada a foto do suspeito amarrado de forma degradante. Era uma fotografia típica de blogs policiais sensacionalistas ou lista de WhatsApp que semeiam informações de barbárie. Custei a acreditar que era no O POVO. Editado em 2003, o Guia de Redação e Estilo, no capítulo “Normas jornalísticas do O POVO”, já vetava este tipo de recurso. “O jornal não usa fotos de pessoas acusadas de crimes. As exceções serão discutidas entre chefia de Redação e editores do núcleo”, diz. O agravante: o suspeito era retratado de forma humilhante.


Ali, não era o jornalismo de segurança que se pensou e mudou há duas décadas na empresa. Por algumas horas, foi esquecido o tema segurança pública para voltar ao vício do jornalismo policial. Assim também como o foi a descrição do estado em que foi achado o corpo do menino. Vale ressaltar que, tão logo a Redação tomou conhecimento do alerta, enviado internamente pela ombudsman, sobre a inadequação da foto no Portal O POVO, a imagem foi deletada do conteúdo.


Casos como esses citados acima não deveriam se repetir nas plataformas de notícias da empresa. Sei que, às vezes, existem embaraços que atrapalham a apuração. Até mesmo as fontes se tornam mais fechadas. A insistência, visando a um melhor resultado, é necessária. Dos episódios, é preciso extrair aprendizado. Cobrir a área de segurança a partir de maior complexidade, como busca O POVO, deve ser o procedimento diário. Mesmo indo na contramão do que é mais fácil e rápido na busca pela audiência. É necessário ficar atento sempre, não sucumbir ao resultado das curtidas e reações, resultante de informações sensacionalistas, que, no futuro, podem resultar em perda de credibilidade. No O POVO, a segurança deve sempre ser tratada como um tema para além de ‘Polícia’, o que exige método mais complexo.

 

UM OLHAR PARA FRENTE

A intenção, neste espaço, é destacar, também, como a cobertura da área de segurança deve ser feita. Ainda na edição da terça-feira passada, O POVO editou uma matéria que pode ser considerada um acerto do ponto de vista do que se deseja dentro de um jornalismo que trabalha o tema de forma mais ampla. A cobertura que O POVO editou sobre a divulgação da pesquisa “Índice de Homicídios na Adolescência” (ver fac-símile) resultou em um bom conteúdo. O texto foi escrito a partir de levantamento feito pelo Laboratório de Análise da Violência (LAV), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), que tratava de assassinatos de jovens no Brasil.

 

Além de mostrar os índices de mortes de jovens, que é alarmante (basta dizer que Ceará e Fortaleza lideram o ranking), o conteúdo teve por mérito fazer uma análise específica do Estado e da Capital. Foi além dos dados, a partir de entrevistas com especialistas, focando também em outra pesquisa local, Trajetórias interrompidas, do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, divulgada em conjunto. De falta, apenas, exemplos de quem são estes jovens entre 12 e 18 anos que morreram violentamente no Estado, o que tornaria a matéria mais robusta e humanizada.


PARA ACIONAR A OMBUDSMAN

Os leitores das diversas plataformas do O POVO podem entrar em contato com a ouvidoria pelo WhatsApp - (85) 988 93 98 07; por email (ombudsman@opovo.com.br) e por telefone fixo (3255 6181). O leitor pode ainda visitar a ombudsman se necessário. Basta ligar e agendar.

 

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