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A Petrobras entre duas tormentas
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Henrique Araújo é jornalista e mestre em Literatura Comparada pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Articulista e cronista do O POVO, escreve às quartas e sextas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades e editor-adjunto de Política.

A Petrobras entre duas tormentas

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Uma estatal com cara de empresa privada ou empresa privada com cara de estatal? Para uma coisa a greve dos caminhoneiros serviu: colocar a Petrobras na ordem do dia. É um assunto que certamente marcará presença na corrida eleitoral. Isso é ótimo, mas também preocupante.

 

Com capital misto, a companhia foi do inferno deficitário pós-Lava Jato à recuperação econômica com Pedro Parente. Na esteira da confiança do mercado e dos ventos liberalizantes que se seguiram ao impeachment de Dilma Rousseff (PT), passou a praticar o que se convencionou chamar de indexação ao dólar, com tarifas oscilantes atreladas ao mercado internacional. Com isso, impôs uma alta volatilidade ao custo do combustível, o que acabou pesando no bolso no consumidor e resultando no levante dos motoristas de cargas e desabastecimento.

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Ou seja, a gestão dos preços saiu de um extremo para o outro: foi do represamento dos anos petistas, sobretudo “dilmistas”, cuja finalidade era manter a inflação controlada mas acabou produzindo perdas sucessivas para a empresa; até o laissez-faire da era Michel Temer (MDB), que significou carestia para a sociedade e ganhos vultosos para os acionistas. Entre um e outro, não houve meio-termo.

 

Ocupando polos opostos e por razões diversas, as duas políticas erraram a mão. Num caso, por tratar a empresa exclusivamente como estatal a serviço de uma demagogia eleitoreira que acabou em desastre econômico. No outro, por acreditar que a Petrobras é um ente essencialmente privado ao qual interessava somente a majoração dos lucros de seus sócios. Ambas jogaram a empresa no olho do furacão. Todos pagamos caro por isso.

 

E aí chegamos a um quadro de anomalia. A petroleira se comporta hoje como um híbrido: uma monopolista de capital misto praticando uma política privada com um bem crucial (o combustível) sem que haja a devida regulação do governo, acionista majoritário. É o avesso do que houve no governo Dilma.

 

UM TITANIC CONTINENTAL

Qual o desafio, então? A companhia requer uma hábil engenharia para se chegar ao preço justo. Isso é tema econômico e político. Como tal, deve estar obrigatoriamente nas eleições. Esse é exatamente o perigo.

 

Até aqui, os pré-candidatos têm se valido de respostas vagas e populistas, seja na defesa ou na condenação da greve dos caminhoneiros e da precificação dos combustíveis. De Jair Bolsonaro (PSL) a Geraldo Alckmin (PSDB), passando pelos presidentes da Câmara Rodrigo Maia (DEM) e do Senado Eunício Oliveira (MDB), agem como biruta de aeroporto, acenando ao vento que sopra. E o vento não tem sido favorável à Petrobras.

 

Os postulantes ao Planalto defendem uma revisão da política de preços, mas não sugerem nada para o seu lugar. Nesse sentido, contribuem para aumentar a crise e se mostram tão perdidos quanto o governo Temer e o seu séquito de ministros atrapalhados que, dia sim, dia não, ocupam minutos na TV para dizer o que não sabem, avaliar o que não conhecem e prometer o que não podem.

 

Moral da história: como um Titanic de proporções continentais, o Brasil vai de encontro ao iceberg, mas ninguém é capaz de desviar a sua rota. Na proa e na popa da embarcação, os personagens da crise estão aturdidos, atirando-se uns sobre os outros à procura de um bote salva-vidas a fim de escapar do naufrágio iminente.

 

E o eleitor? Vai atuando como os integrantes da orquestra que continua a tocar enquanto o barco afunda. Até outubro, quando teremos uma chance única de resgatar o navio, é possível que o nível da água ainda não tenha chegado ao pescoço.

 

PIZZA GRANDE PELO PREÇO DA FATIA

Pesquisa Datafolha feita por telefone mostrou que 87% das pessoas consultadas apoiam a greve dos caminhoneiros, mas não querem pagar a conta das bondades garantidas pelo Planalto à categoria, ou seja, cerca de R$ 13 bilhões entre suspensão de tributos e subvenções.

 

O brasileiro é um tipo curioso. Quer Estado máximo e uma conta mínima. Defende meritocracia, mas adora cortar uma fila e bancar o malandro. Sonha com aposentadoria plena, mas detesta falar sobre reforma da Previdência. Esse é outro aprendizado da greve: a fatura sempre chega.

 

Foto do Henrique Araújo

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