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Churchill e o dever do líder
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Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros

Churchill e o dever do líder


O filme Churchill (Reino Unido, 2017), do cineasta australiano Jonathan Teplitzky, não empolga. A tentativa de dar uma humanidade ao lendário primeiro-ministro britânico acabou em cenas de compaixão fake. Mas valeu a pena ver o trabalho do ator escocês Brian Cox, que interpreta Winston Churchill (1847 – 1965), e, principalmente, a mensagem tão urgente e necessária aos tempos atuais de que os grandes líderes são aqueles que, mesmo contrariados na luta de bastidores, têm por obrigação contribuir com o êxito da causa.


Nessa obra sobre guerra, mas sem foco nos campos de batalha, o diretor mostra o quanto Churchill teria se esforçado para inviabilizar o desembarque das tropas aliadas na Normandia, ação militar de alto risco realizada em 6 de junho de 1944 por determinação dos Estados Unidos e configurada como a operação decisiva para a consolidação da derrota nazista na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945).


Líder experiente, temperamental, perfeccionista e cheio de fortes convicções, Churchill, mesmo sendo contrário à operação de guerra que ficou conhecida como Dia D, lançou mão dos microfones da BBC de Londres e discursou pela vitória, pois, para ele, naquele momento o seu papel de homem público responsável era o de, diante de um explosivo contexto militar e diplomático, passar confiança, estimular a coesão e promover a estabilidade emocional da nação.


É cinema, não precisa ter sido exatamente assim. Entretanto essa leitura dos fatos confere importância ao filme e a Winston Churchill pela reconhecida bravura, lealdade à Coroa e consciência da sua missão como referência do Reino Unido na história universal. Atitude como essa, que privilegia o propósito e não o modo de conquistá-lo, coloca em debate a moral dos interesses no ambiente da política.


Os interesses dependem de perspectivas, anseios e aspirações individuais e coletivas. São legítimos e essenciais para a vida social e para o exercício do poder. O que se vive hoje no Brasil, por exemplo, é a troca da luta pela prevalência de interesses por uma obsessão das vantagens escusas, isto, sim, ilegítimo e deplorável. Instalou-se no País a regra do vencer por vencer e, nesse combate sem ganhadores vão caindo por terra o senso de justiça, os valores e os princípios do Estado democrático de direito.


Muitos dos responsáveis por essas mazelas demonstram um grau tão elevado de vazio de sentido que não parecem sequer ter interesses, nem os seus próprios, tamanha a insensatez. Mataram o superego, aquele motor psíquico que cuida da sobrevivência moral, e já nem se assustam com ameaças de cadeia. Até os velhos comportamentos ambíguos, que fingiam preocupação social, deram lugar a ação de uma moral inconstrangível dominada pela descompostura e pela inteligência ardilosa.


Diferentemente do personagem Churchill, esses malfeitores da política não ligam para as incertezas que provocam no seio da população; pelo contrário, nutrem-se delas para permanecer vencedores não se sabe bem de quê. Como os cartógrafos do mundo antigo, que povoavam de monstros e abismos as fronteiras dos territórios que desenhavam, valem-se de pavores disfarçados de proselitismos religiosos e dogmas de extremismos ideológicos que repercutem na sociedade como se tudo se resumisse à falta de entendimento entre os que desperdiçam e os que não têm o que desperdiçar.

Foto do Flávio Paiva

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