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A ascensão de Bolsonaro tem a ver com o lamaçal

2017-11-19 00:00:00


Sempre citado com algum desdém, Jair Bolsonaro foi enfim mencionado publicamente como um político a ser combatido por gente do quilate de Fernando Henrique Cardoso. Correto. A tarefa é imediata. Não pelo sujeito ser “de direita” – falo disso no tópico seguinte -, mas por ser autoritário. Na mesma medida em que boa parte da esquerda o é, diga-se. 


Escrevendo, me vem à mente que é preciso colocar o nome do partido na sequência do nome do político. Uma regrinha básica do bom jornalismo. Mas, qual é o partido de Bolsonaro? Pois é. Não sei. Preciso pesquisar.
 

Opa... é outro sintoma de que as coisas não vão nada bem. Temos um candidato a presidente da República, que aparece muito bem nas pesquisas, é parlamentar federal há mais de duas décadas e ninguém sabe de que partido o sujeito é.
 

Ele é hoje do PSC, mas já foi filiado a um amontoado de insignificâncias partidárias, como o PDC, o PPR, o PPB e o PP. Não importa. Nem ele e nem ninguém liga para isso. Bolsonaro gosta de ser um outsider. É sempre o espaço ideal para proferir suas grosserias e nada construir.
 

Mas Bolsonaro parece ter saído desse gueto. É a consequência da maior tragédia política que o Brasil República já viu germinar. Ao cooptar políticos e partidos com grana da corrupção com a máquina pública, Lula-lá e a nossa esquerda levaram a todos de roldão. O Jair em questão só por isso se sobressai.
 

O imenso vácuo de credibilidade que se formou com o lamaçal tóxico descoberto pela Lava Jato se juntou à recessão, ao desemprego e à desesperança para formar o caldo político, econômico e social propício ao nome de Bolsonaro. Daí, passou a ser idolatrado por uma multidão de jovens incautos e, quase sempre, despreparados.
 

 

BOLSONARO E AS ESQUERDAS
 

Bolsonaro é de direita? Bom, durante décadas a fio o termo “direita” passou a ser relacionado com tudo o que mantivesse proximidade com a ditadura dos militares brasileiros, instalada em 1964. Se o sentido correto do termo fosse esse, de fato, o deputado seria de direita. O homem foi um aguerrido oficial apaixonado pelo que de pior os militares produziram no poder, como a tortura.
 

Sempre muito influente, a esquerda trabalhou bem para caracterizar de direita tudo o que não fosse esquerda ou não concordasse com ela. É a teoria dos dois palanques. A esquerda e os outros. Os “outros” formam um balaio de gatos, alhos e bugalhos. Viúvas da ditadura, democratas cristãos, liberais e tudo o mais que faça oposição à esquerda. No fim das contas, são todos chamados de “elite”.
 

Na verdade, Bolsonaro é um nacionalista de coturnos que, por isso, está muito mais próximo da esquerda que da direita. Basta ver seus votos na Câmara dos Deputados. Levantamento feito pelo blog “O E$pírito das Leis”, assinado por Bruno Carazza, e abrigado pela Folha de S.Paulo, mostrou muito bem esse ponto. Vejam.
 

“Não obstante o discurso liberal adotado recentemente, o pré-candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSC) votou com o PT em temas econômicos durante o segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso (1999-2002) e todo o governo Lula (2003-2010)”.
 

“Compilando o texto das ementas dos projetos em que Bolsonaro e PT votaram igual entre 1999 e 2010, nota-se um predomínio de temas associados à Nova Matriz Econômica –visão intervencionista da economia levada a cabo pelo PT”.
 

Mais: “Bolsonaro concordou com o PT nas votações de projetos que tratavam de concessões de benefícios para o setor privado, como incentivos tributários, parcelamentos de débitos, créditos orçamentários, fundos, financiamentos, subvenções etc. Uma pauta bem distante de políticas econômicas horizontais e não intervencionistas, portanto”. 


Ou seja, só se enxergam as diferenças quando está em pauta a agenda dos temas que se relacionam com o “politicamente correto”.
Pois é.
 

ATO DE APROXIMAÇÃO
 

Na manhã da última sexta-feira, no Palácio da Abolição, deu-se a primeira visita de Eunício Oliveira (PMDB) a Camilo Santana (PT). No dizer de um interlocutor que presenciou o encontro “serviu para quebrar um pouco mais o gelo”.
 

O prefeito Roberto Cláudio estava presente. Zezinho Albuquerque, que preside a Assembleia, também. Os articuladores do evento, que anunciou uma série de obras em Fortaleza, boa parte com dinheiro federal desenganchado pelo senador, tiveram o cuidado de deixar Cid Gomes fora. Claro, com a concordância do próprio.
 

Gelo quebrado, não duvidem se no próximo ato similar ao desta sexta-feira, o ex-governador já estiver presente e posando para fotos ao lado do senador. Feito velhos amigos. Como é peculiar, as redações vão garimpar frases em que um ataca o outro que secreta veneno contra o um.
 

Os políticos, de maneira geral, deveriam ser mais cuidadosos na hora de atacar seus oponentes. Não é coisa agradável de ver quando o atacado de ontem passa a ser aliado de amanhã. E vice-versa. O eleitor, coitado, fica ainda mais descrente.
 

EMBAIXADAS E AFAGOS
 

A questão política local está longe de se fechar. A questão nacional, há tempos digo, ainda vai exercer grande influência nos rumos das disputas estaduais. As grandes questões são as seguintes: o PMDB terá candidato a presidente? O PMDB se aliará aos tucanos para a disputa presidencial? E O DEM, como se comportará?
 

Depois de respondidas essas questões, outras vão surgir. Como por exemplo: os partidos vão levar as alianças nacionais para os estados, verticalizando o processo? Tudo dependerá, é claro, da conjuntura. Se a prioridade for eleger o presidente, os partidos vão fazer o que for necessário, inclusive a verticalização.
 

Portanto, por enquanto, encontros, troca de afagos (Camilo puxou salva de palmas para Eunício) e outras embaixadas são próprias do jogo pré-eleitoral. O raciocínio político é o seguinte: melhor trabalhar para deixar portas abertas do que ter que abrir às pressas e em cima da hora.

Fábio Campos

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