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Bolsonaro, a imprensa e a noção de público
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

Bolsonaro, a imprensa e a noção de público

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Os primeiros indicativos da relação do governo eleito com a imprensa preocupam. Nessa relação, Bolsonaro sinaliza para algumas práticas bem antigas, aliadas a métodos repaginados.

 

Característica que marcou a trajetória da candidatura desde a origem foi a hostilidade com jornalistas. Isso prosseguiu até depois da eleição, com ofensas de assessor a profissionais num grupo de WhatsApp e patada gratuita de futuro ministro até em repórter estrangeira. É um método.

 

Em uma das primeiras entrevistas após eleito, na Band, Bolsonaro falou sobre a censura ocorrida na ditadura militar. Segundo ele, era permitido criticar o governo. As informações censuradas teriam intenção não de proteger o regime das críticas, mas evitar o envio de mensagens cifradas para que fossem cometidos crimes por grupos subversivos. Um delírio. Esse nem mesmo era o argumento oficial alegado à época. (Em 1975, a primeira versão de Roque Santeiro foi proibida de ir ao ar. O motivo não era mensagem cifrada, mas o fato de escuta telefônica ter flagrado conversa entre o historiador Nelson Werneck Sodré e o escritor Dias Gomes, na qual o autor da novela dizia que Roque era, na verdade, uma versão disfarçada de "O berço do herói", peça proibida em 1965.)

 

Bolsonaro justificou a censura, mas não me parece que tenha intenção de censurar a imprensa hoje. Seu método de hostilidade é desacreditar os meios de comunicação. Melhor que controlá-los é atacar a credibilidade deles. Tentar fazer com que as pessoas não acreditem neles. Isso só é possível quando se tem séquito de seguidores fiéis e dispostos a seguir fielmente o líder. Um perigo.

 

Colocar em prática esse tipo de estratégia não é algo tão novo. O PT tentou fazer o mesmo. Terminou esta campanha se apegando a alguns dos mesmos veículos que tanto combateu. Não muito diferente da eleição anterior, quando reportagem da Folha de S.Paulo sobre o aeroporto no município mineiro de Cláudio já foi arma crucial na campanha contra Aécio Neves (PSDB). Ocorre que, até pelos novos instrumentos disponíveis, isso nunca foi tão eficaz quanto agora.

 

Esse método não é novo e o outro é do arco da velha. Em entrevista ao Jornal Nacional, Bolsonaro disse com todas as letras que cortará verbas publicitárias como forma de retaliar veículos críticos. Não é novidade e é uma excrescência. Surpreendente é que diga com tanta transparência algo que flerta com a improbidade administrativa. Porque, qual a diferença entre não entregar verba pública a jornal que critica e entregar a quem elogia? Qual a diferença entre isso e um mensalão da imprensa?

 

Na quinta-feira, 1º, ele mostrou outra face de como pretende combater quem critica. Escolheu os veículos de imprensa que participariam de sua primeira entrevista coletiva. Ficaram fora Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo, Valor Econômico, CBN, O Globo e até a EBC. Num sinal de como deve tratar a empresa pública de comunicação, ele não a deixou entrar na entrevista coletiva. Tiveram acesso TV Globo, Globonews, Record, Band, SBT, RedeTV, Jovem Pan, UOL, G1 e Reuters.

 

O presidente eleito dá dois recados. Mostra que não entende o caráter público de sua função. E deixa claro que, além das verbas, usará a informação para favorecer determinados veículos, em detrimento de outros cuja postura desagrade.

 

Pode parecer problema de jornalista. Porém, a hostilidade e a tentativa de controlar a informação é característica comum a todo autoritarismo.

 

SEM NEGOCIAÇÃO

Interrogação que havia sobre o governo Jair Bolsonaro (PSL) era a capacidade do presidente de cumprir a promessa de que não faria concessões políticas nas indicações. A montagem do ministério apenas começou, mas, por ora, ele cumpre o que prometeu.

 

Três ministros haviam sido definidos antes mesmo da eleição: Paulo Guedes na Economia, general Augusto Heleno na Defesa e Onyx Lorenzoni na Casa Civil. Este último é o único político de fato. Deputado pelo DEM há anos. Mas, a escolha vem da relação pessoal. O partido nem mesmo o apoiou formalmente.

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Após a vitória, confirmou duas grifes: o astronauta Marcos Pontes e o juiz Sérgio Moro. Vejamos se a composição do restante da equipe seguirá sem cotas partidárias. E como conseguirá governar se compuser a administração dessa maneira. Como será capaz de aprovar as polêmicas medidas que pretende. Até hoje, ninguém tentou fazer um governo inteiramente dessa maneira. Caso consiga, poderá ser um golpe nessa forma de rateio político, no fisiologismo mais tradicional.

 

Foto do Érico Firmo

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