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Jogo de rasteiras
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

Jogo de rasteiras

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Para poupar o leitor de precisar prosseguir na leitura para saber o que penso da polêmica sobre a libertação ou não de Lula: há uma sequência de absurdos de todos os lados. Não consigo ver razão em ninguém. Aliás, nem razão, nem equilíbrio, nem senso de justiça, nem responsabilidade. A questão é gravíssima e vai muito além de Lula. Quando se coloca o ex-presidente na questão, as pessoas perdem qualquer resquício de racionalidade. As paixões e ódios tomam conta e nada mais parece importar. Porém, o problema que se está criando é muito maior que ele. Nossas instituições estão mais frágeis que na semana passada. E elas já estavam mais frágeis que no ano passado. Não é a prisão ou soltura de um detento. Não são os abusos de um juiz ou um desembargador. É o sistema jurídico que está, em bom português, avacalhado. Isso é um risco para todo mundo.

 

O Poder Judiciário tem sido protagonista de um jogo de rasteiras. Os magistrados não julgam. Tentam, sim, fazer com que suas posições prevaleçam. E usam de qualquer instrumento ou brecha para isso. Flexibilizam entendimentos e fazem ginástica, malabarismo hermenêutico para tentar impor o que eles pensam. Não é papel a que se prestem os juízes, desembargadores e ministros.

 

DECISÃO DESCABIDA DE FAVRETO

A decisão do desembargador Rogério Favreto não era cabível para um plantão. Verdade, ele poderia analisar a qualquer tempo reclamação sobre abuso em pena de restrição de liberdade. A análise vá lá, mas a concessão não atendeu ao critério de urgência. Ele argumentou que Lula estava tendo cerceada sua atuação como pré-candidato a presidente. Mas Lula não foi preso agora. A candidatura dele não surgiu agora. Não havia nenhum debate do qual ele iria participar no fim de semana. Enfim, não aconteceu nada no fim de semana que justificasse reverter assunto tão discutido em tantas instâncias tantas vezes.

 

O risco de se olhar apenas para o caso de Lula é não perceber a amplitude que nisso pode ter. Na Justiça do Ceará, decisões em plantões do Judiciário serviram, recentemente, para libertar mandantes de diversos assassinatos e grandes criminosos. Mais tarde, soube-se que os habeas corpus eram comprados a altas somas. O pedido ocorria estrategicamente, conforme o magistrado de plantão. A escala de plantonistas virou instrumento para direcionar o processo a um julgador específico. Esse é o tamanho do risco envolvido. Quem comemora o caso de Lula não devia perder de vista o perigo de liberar decisões estapafúrdias em plantão. Os casos têm juízes naturais e driblar isso abre precedente para manipular decisões, muito além da política.

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INTERVENÇÃO INDEVIDA DE MORO

Certa ou errada, entretanto, a decisão do desembargador deveria ser cumprida, até que fosse derrubada. Sérgio Moro não tinha nada que sair das férias dele para dar ordem para não cumprirem decisão de instância superior. Não era papel a que se prestasse.


Pode-se dizer que a decisão de Favreto era indevida — e era. Que o argumento era descabido — e é muito discutível mesmo. Mas Moro não tinha prerrogativa, autoridade, poder ou direito para dizer para não cumprir. Era só o que faltava.


Não é a primeira vez que magistrado toma decisão questionável em plantão, mas o canal jurídico para rever isso foi absolutamente anômalo. Moro não é onipotente. Sua autoridade não é ilimitada. Quem aplaude a decisão de manter Lula preso não devia perder de vista o risco que o autoritarismo do Judiciário representa.

 

Essa bagunça é perigosa e não é porque Lula vai permanecer preso ou pode ser solto. Questões muito maiores estão em jogo.

A JUSTIÇA DO VALE TUDO

Uma coisa estranha na decisão de Favreto foi a urgência em que ele cobrou a decisão. No intervalo de poucas horas, deu dois despachos extras e, ao final, fixou prazo de uma hora para que fosse cumprida. No fundo, sabia que, se a libertação não ocorresse no seu plantão, ela seria revista. Isso não é correto. Tentou driblar os juízes e as instâncias que já decidiram o assunto para fazer prevalecer sua vontade.

 

Moro, por sua vez, interveio para que a decisão coubesse ao relator porque sabia que Gebran Neto manteria a prisão. Então, o juiz da instância inferior quis dizer quem deveria julgar a questão na instância superior. Do mesmo jeito, quis fazer prevalecer sua posição.

Tanto um quanto outro estão sendo tudo, menos juízes. São atores políticos, e de uma politicagem miúda. É deplorável o vexame ao qual submetem a Justiça. Vira questão quase pessoal para eles, disputa na qual agem como partes. Seguem exemplo de cima. Trato disso amanhã.

 

Foto do Érico Firmo

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