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O crime de uns e o crime de outros
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

O crime de uns e o crime de outros

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que Geraldo Alckmin (PSDB) deve ser investigado por crime eleitoral pelas doações que recebeu da Odebrecht. Assim, ele fica fora da Lava Jato. A consequência? A possível punição será muito mais branda, se houver.

Importante mudança introduzida pela Lava Jato foi buscar o porquê de doações de campanha. Qual o motivo de empresas interessadas em contratos públicos despejarem um caminhão de dinheiro em candidaturas? Ideologia? Patriotismo?

A Lava Jato demonstrou que mesmo doações legais foram usadas para camuflar e lavar propina. Políticos denunciados sempre gostaram de dizer que suas contas foram aprovadas pela Justiça Eleitoral e em Tribunal de Contas. Grande coisa. Essas instâncias deixam passar as maiores barbaridades.

Quando as planilhas de doações de empreiteiras começaram a aparecer, muitos argumentaram que haviam declarado os valores recebidos. Isso não queria dizer nada. Era forma de maquiar o dinheiro irregular.

Por bem: Alckmin nem declarar declarou. O dinheiro ficou oculto. A Procuradoria Geral da República afirmou que não há nenhum indício de favorecimento ou mesmo pedido em troca da doação. Por isso, seria apenas crime eleitoral. No máximo caixa dois.

O problema nem é saber por que cargas a Odebrecht colocou dinheiro na campanha de Alckmin, se não esperava benefício. A questão real é: qual o motivo para a doação não ter sido declarada? Por que esse dinheiro precisava permanecer oculto? O que justifica que esteja fora da contabilidade oficial?

Esse é o ponto. Não venham me dizer que foi apenas atecnia contábil. Que o contador esqueceu de botar o número na planilha e, caso tivesse colocado, tudo estaria bem. As razões precisam ser esclarecidas. Esse é o cerne do possível crime.

Ora, a Odebrecht tinha um setor de propinas. Cometia irregularidades até em doações feitas às claras. Dá para aceitar como fato que uma doação não declarada estivesse regular, dentro da lei? Sem outro crime que não o fato de estar fora da contabilidade oficial? Inverossímil.

A empreiteira cometeu fraudes para todo lado, mas com o tucano fez tudo direitinho. Aliás, quase, pois “esqueceu” de declarar a doação. Essa história convence alguém?

Se não explicar as razões, é sinal de que a investigação sobre Alckmin está, no mínimo, mal feita. Não digo que o motivo seja necessariamente propina. Mas, alguma coisa tem. Na origem, no destino ou na motivação do pagamento. Não tem erro.

ESTRATÉGIA ANTIGA

Na época do mensalão, o PT e vários outros partidos tentaram justamente enquadrar o crime como “apenas caixa dois”. Na época, não colou. Era o mesmo caminho para buscar punição menor. Ocorre que não fazia sentido antes e não faz agora. Esse negócio de “apenas caixa dois”. não existe. Não falo isso de agora.

Observe o que escrevi na coluna de 21 de setembro de 2016: “A questão do caixa dois é o que está por trás. Afinal, por qual razão o dinheiro não foi declarado? Por que deveria permanecer oculto? O que o impede de aparecer na contabilidade da campanha? O problema do caixa dois é o que ele esconde: crimes de corrupção, lavagem de dinheiro… (...) não existe ‘apenas’ caixa dois. Recursos ficam fora da contabilidade oficial por certas razões. Essas motivações são o crime em si. Um paralelo: há substâncias consumidas por atletas que não provocam ganho de desempenho. Mas são proibidas e tratadas como doping porque sua presença no organismo faz com que exames não consigam identificar substâncias que geram melhora de desempenho. Assim é o caixa dois: a gravidade está no que esconde”. Leia neste link: bit.ly/caix2

Não descarto que o caso de Alckmin possa ser o primeiro de “só caixa dois”. A Odebrecht e ele esconderam as informações, sei lá, por timidez. Discrição. Não gostam de ostentar. O motivo que for. Isso mesmo a empreiteira sendo confessa em uma das mais longas listas de crimes da história política no Brasil. Mas, com o tucano, foi só problema do contador.

Ainda assim, ficará estranho. Passará sempre a imagem de que há dois pesos

 

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