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A perturbadora familiaridade da violência
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

A perturbadora familiaridade da violência

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Tragédia é tragédia em qualquer lugar e com qualquer ser humano que envolva. A ideia de que há sofrimentos maiores ou piores, a comoção seletiva, é uma das razões de se ter permitido chegar onde estamos. A violência é admitida em alguns territórios e com algumas vítimas. Quando ultrapassa essas fronteiras, cria-se a instabilidade social.

Porém, a empatia tem limites. Nas chacinas do Curió e das Cajazeiras, fui acordado com a notícia dos crimes. Na última sexta-feira, fui dormir com a informação das execuções no Benfica, ainda sem a dimensão exata da ocorrência. E, por mais tocado que tenha ficado com os dois casos anteriores, desta vez foi diferente.

Há um nível de experiência que só a familiaridade traz, e isso transforma a relação com a violência. Meu pai nasceu a um quarteirão da praça onde ocorreu a chacina da última sexta-feira. Ainda tenho tios que moram ali. A Gentilândia foi paisagem definidora da minha infância. Corria entre as praças vizinhas. Ali aprendi a jogar bila. No início da vida adulta, foi ali que vivi o ambiente da universidade. O lugar faz parte de quem sou, em diferentes fases.

Na barbárie da última sexta, tive contato com o tipo de sentimento em relação às chacinas que, pelo menos há três anos, já é conhecido de moradores do Cais do Porto, Curió, São Miguel, Sapiranga, Granja Lisboa, Bom Jardim, Cajazeiras. Na Região Metropolitana de Fortaleza, a lista inclui Aquiraz, Horizonte, Maranguape, Pacatuba, Paraipaba…

Crimes sempre chocam, ou deveriam chocar, mas, quando em cenário familiar, no qual você já esteve algumas vezes, frequentado por seus amigos, cria-se grau de intimidade indesejada e perturbadora.

Nasci e cresci em área pobre e que se tornou violenta, o Jardim América. Convivi com crimes próximos a locais onde morei e moro. Mas nunca tive contato com violência dessa dimensão e tão perto. Essa é a minha realidade e de uma minoria de Fortaleza. A maioria já tem essa triste familiaridade.
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Fortaleza acostumou-se há muito ao triste hábito de ser perigosa. Porém, o que ocorre há dois ou três anos atinge outro patamar: a barbárie urbana, a violência pela violência, dos corpos queimados, decapitados, das crianças mortas para dar lição aos pais.

Essa realidade se mantinha periférica e, portanto, invisível à esfera pública. São reflexo da criação de Estados paralelos e, sobretudo, da guerra aberta entre eles. Um conflito cada vez menos restrito a limites territoriais.

O Benfica é talvez o maior ponto de encontro das várias Fortalezas depois do Centro. Estudantes das mais abastadas famílias convivem com egressos de escolas públicas, pessoas do Interior, os que dependem de assistência estudantil ou os que, muito jovens, pelejam para conciliar o estudo com a condição de arrimo de família. Essa diversidade de realidades e experiências de cidade se encontra ali e saiu ferida.

 

A REAÇÃO À DISCIPLINA DO GOLPE

Começou na semana passada, na Universidade Federal do Ceará (UFC), a disciplina voltada à discussão sobre o assim denominado golpe de 2016. Independentemente da opinião que se tenha sobre a iniciativa, uma coisa é certa: se a intenção era coibir a ideia, o Ministério da Educação não podia ter feito bobagem maior que tentar proibir a cadeira na Universidade de Brasília (UnB). O efeito foi tão imediato quanto previsível. Disciplinas da mesma natureza se espalharam por dezenas de universidades pelo Brasil e também algumas no Exterior. A polêmica deu visibilidade, como sói acontecer com quase tudo.

O MEC chegou ao requinte de pedir ao Ministério Público para investigar os professores responsáveis por improbidade administrativa.

Seria realmente só o que faltava, diante das denúncias que há contra este governo, o condenado por improbidade acabar sendo professor por causa de uma aula.

 

Foto do Érico Firmo

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