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Os natais que ainda me faltam
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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

Os natais que ainda me faltam

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Preciso do Natal todos os anos. Mesmo que o consumo desembeste e o surto (meio falso) de gentileza prevaleça durante os dias que antecedem a culminância da história recontada há séculos.
 


Tal e qual qualquer vivente dos dezembros, também desejo comprar para não chegar de mãos abanando para alguns quereres. É bom presentear.
 


Penso que exagero no shopping (a besta fera sedutora). Mas não fico aperreado apesar da sensação de que a gastança poderia ter sido muito menor.
 


Daí, provável, aquele sentimento fuleiragem da culpa pelo desfrute do esbanjamento e o receio de ter dado cabimento demais ao lado profano da efeméride. Fátima me ensinou o prazer.
 


Compreendo a face religiosa do Natal. Talvez, por ter sido um projeto Redentorista de praticante da Teologia da Libertação. E, ainda, ter conhecido alguma coisa da Renovação Carismática onde não fui muito longe.
 


Mas nunca aguentei ouvir besteiras do tipo: “não se esqueça do verdadeiro aniversariante do dia” ou Natal é tempo de “reconciliação”, “perdão”, “amor” ou “vida que nasce nos corações”...
 


E não é descrença no menino, com poderes mágicos, que a encantante Maria pariu e José foi o melhor dos homens que ouvi dizer. Não, não.
 


A história desse conto fantástico ainda me pega. Porque nunca foi lugar de melancolia. Nem no tempo da pindaíba lá de casa, quando os comerciais da Estrela iludiam meu juízo e o dos cinco irmãos.
 


Todo ano, acreditava naquele presente que a TV mentia ao dizê-lo possível. Nunca vinha, mas num daqueles 24 chegou uma Caloi para ser dos cinco. A Régia ainda era um bebê.

 

Não me lembro quando ouvi, pela primeira vez, esse conto ou quem enredou. Se foi mamãe, Maria Edmar, ou dona Julinha, a catequista do Porangabuçu. Tenho inveja de quem o escreveu.
 


Não mudaria, talvez, a vida de José nem de Herodes. A do menino, o desenharia quando criança sendo pivete no areal de Nazaré. As brincadeiras, a estranheza de ser diferente dos outros e o dia em que descobriu a sina sem ter o direito de não poder desistir.

 

As coisas do divino não são de deixar a gente entrar nos segredos dele.
Pois bem. Quando vai chegando o Natal, penso na mesa farta, na Missa do Galo, no presente debaixo da rede, nas rezas de minha mãe, na sidra Cereser (horrível)...

 

No encontro com meus irmãos, irmãs, sobrinhos, nas famílias e suas arengas... Na moça que fugiu para o Canadá, mas que daria tudo pela ceia no Jardim América... Nos olhos das crianças miseráveis que me acharam no lixão do Jangurussu...

 

Penso no gosto de azeitonas verdes, rabanada, no Papai Noel da Coca-Cola, em velocípede, Forte Apache, Falcon, Genius, recuperação e férias...

 

No dia depois da noite de Natal na Tavares Iracema. No Saulo, na Sarah, no Pedro e eu assistindo ao Grinch... Nos natais que ainda me faltam... Até penso em neve em Parambu, apesar de detestar o frio.
 

DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO demitri@opovo.com.br

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