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Alguns efeitos da sorte e do azar

2017-08-12 17:00:00

Por sorte, hoje, 13 de agosto, é domingo. Já pensou se fosse uma sexta-feira? E a gente fica se perguntando se essa história de dias de sorte ou azar tem algum fundamento. O que dizem os cientistas sobre isso?


Os estatísticos, trabalhando com a frieza dos números, garantem que, após lançar uma moeda e obter uma sequência de cinco caras, a chance de obter outra cara no sexto lançamento continua sendo a mesma: 50%. Mesmo assim, eles citam um fenômeno que chamam de “efeito de regressão”.

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Considere duas variáveis fracamente relacionadas entre si. Se uma delas apresenta um valor muito alto, a outra costuma apresentar valores baixos. Ou vice-versa. Por exemplo, filhos de pais muito altos costumam ser mais baixos que eles. A sequência de um filme de muito sucesso em geral decepciona. E assim vai.


Lennon e McCartney disseram isso na música Getting better: “Vai melhorar, pois não dá para ficar ainda pior”. Parece que isso não vale para o Brasil de hoje.


Quando a coisa está preta, tenta-se qualquer tipo de solução. Em times que perdem muitos jogos seguidos — pense o São Paulo — a solução costuma ser trocar o técnico. Logo a seguir, se o time voltar a ganhar, dá para dizer que a melhora foi causada pela mudança do técnico? Ou foi apenas o efeito de regressão?


Quem se recupera de uma doença depois de usar algum tipo de tratamento alternativo costuma acreditar que o tratamento foi a causa da cura. Pelo efeito de regressão, talvez a cura se desse mesmo sem nenhum tratamento. Quem não tem paciência para esperar os efeitos do tempo e da ação do próprio organismo sempre vai acreditar que gengibre cura gripe. Talvez até cure mesmo.


Já os psicólogos costumam ser mais otimistas e propositivos. Alguns deles afirmam que dá para a gente ajudar a sorte. Os exemplos são muitos e vou citar um, da área da educação, que acho interessante.


Em 1964, o psicólogo Robert Rosenthal fez um experimento que até hoje causa polêmica. Com a permissão e colaboração de Lenore Jacobson, também psicóloga e coordenadora de uma escola em São Francisco, ele submeteu várias turmas de alunos a um teste especial de QI que, segundo afirmava, mediria o “potencial de melhora” das turmas. Isto é, turmas que obtivessem melhores índices no teste, deveriam ter maior chance de alcançar melhores resultados em testes subsequentes.


Depois de um ano, novos testes foram feitos com as mesmas turmas e, realmente, as turmas que tinham obtido índices mais altos no teste de “potencial” conseguiram as maiores notas no teste posterior de verificação.


Só que, na verdade, a coisa toda era uma pegadinha: os testes não tinham nada de especial. As turmas que foram classificadas como de “maior potencial” tinham sido escolhidas por um processo inteiramente aleatório.


Em outras palavras, criar uma expectativa positiva, mesmo artificialmente, pode resultar em maiores chances de obter melhores resultados. Rosenthal chamou isso de “efeito Pigmaleão”. Quem conhece a história do escultor que se apaixonou pela estátua que criou lembra que a deusa Vênus decidiu dar vida à estátua, realizando o desejo do escultor.


O experimento de Rosenthal e Jacobson foi reproduzido e verificado por vários grupos de pesquisadores. Mesmo assim, muitos psicólogos não concordam com os resultados. Além disso, hoje fica mais difícil influenciar alguém que já sabe do truque. E para desencanto dos adeptos da autoajuda, o efeito não funciona com uma pessoa só.


Os psicólogos também dizem que pessoas que usam amuletos alcançam melhores resultados nos jogos. Explicam que essas pessoas costumam ficar mais focadas que as demais. Elas se sentem mais seguras e se tornam mais eficientes.


O interessante disso tudo é que não dá para ignorar os efeitos do acaso.

Na evolução das espécies as mutações são roletas biológicas. Nos X-Men da ficção, as mutações sempre geram superpoderes, mas, no mundo real, elas costumam ser danosas. Só as poucas que trazem alguma vantagem são adotadas pela seleção natural. E quem é agraciado com essas mudanças benéficas, é porque nasceu com a bunda virada para a lua.


Enfim, temos sempre que conviver com as trapaças da sorte. A ciência até pode dar um rumo explicando como ajudar o destino. Quem quer parecer sofisticado faz pouco das superstições, mas é quase impossível não ter nenhuma. Hoje, por exemplo, vai ser um dia de azar para muitos. E de sorte para outros tantos. Estou cruzando os dedos e bato na madeira para que meus leitores estejam nessa segunda opção.

Adriano Nogueira

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