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Segredos íntimos de seu Score

2017-03-25 17:00:00

 

José Evangelista

 

Você tem um Score e é provável que nem saiba o que isso. Pois é bom saber, já que ele afeta bastante sua vida neste mundo consumista em que vivemos.


Para começar, lembre como eram as transações comerciais e bancárias no tempo de seus avós. Sua família comprava quase tudo na mercearia da esquina, as despesas eram anotadas em uma caderneta e pagas no fim do mês. E quando seu avô precisava de um dinheirinho extra para comprar uma máquina de costura para sua avó, vestia o melhor terno e ia conversar com o gerente do banco, certamente um velho conhecido.


Em suma, as necessidades de crédito da família eram resolvidas na base da confiança.


Bons tempos aqueles – mas, só para quem gozava dessa confiança entre a comunidade local. Para um trabalhador braçal, um preto pobre, um socialista, um ateu ou qualquer pessoa que não se ajustasse bem aos padrões estritos da época, as coisas eram bem mais complicadas. Para esses, o mundo não era justo.


Agora, porém, tudo é diferente: os computadores se encarregam de resolver as questões de crédito. Na grande maioria das vezes, não é o banqueiro nem o dono da loja quem decide se um freguês deve ter crédito ou não. São os algoritmos. E essa decisão passa pelo Score.


Seu Score é calculado através de uma variedade de dados que inclui informações sobre você, sua família e seu estilo de vida. Ele é o resultado de um cálculo que inclui sua profissão, seu salário, suas propriedades e bens, seus hábitos de consumo, seu endereço e seu histórico de consumidor. O computador mói tudo isso e cospe um número que varia de zero a 100.


Segundo a Serasa, seu Score informa ao comércio, aos bancos e às agências de crédito se você merece confiança. O órgão diz que isso minimiza os gastos com as operações de crédito no comércio.


Vamos então comparar esse esquema com a situação que existia no tempo de seu avô. Aparentemente, esse novo modo de avaliar seu crédito é mais justo. Afinal, o algoritmo que calcula o Score não está nem aí para a cor de sua pele, sua religião ou sua orientação sexual. Também não se interessa em saber se você é culto, caridoso, nem se é bom pai ou bom marido.


Certo, mas vejamos algumas das coisas que o computador leva em conta quando calcula seu Score. O algoritmo verifica se você alguma vez na vida passou cheque sem fundos, se já foi objeto de algum processo judicial, se é empregado ou empregador, se costuma trocar de cartão de crédito e até onde você mora.


Se seu CEP for 60175 (Papicu) seu Score cresce. Se for 60310 (Pirambu), despenca. Quer dizer, seu Score vai depender não apenas de você mesmo, mas do grupo de pessoas ao qual você se integra. Um escroque que mora em um apartamento merreca na Beira Mar poderá ter avaliação melhor que um cidadão honesto que mora em uma bela casa do Bom Jardim.


Outro fator preocupante é aquele que leva em conta seus hábitos de consumo. Comprar itens de luxo joga o Score lá para cima. Na verdade, nem precisa comprar, basta pesquisar na rede sobre preços de coisas como vinhos caros, joias ou perfumes franceses, por exemplo. O algoritmo registra esses movimentos e eleva seu Score. Portanto, vale a pena fazer esse tipo de pesquisa de vez em quando, mesmo não comprando nada. Só que depois de algum tempo o programa vai acabar aprendendo que você está a fim de embromá-lo.


Quem tem Score alto, pode ter alguns privilégios. Quando você liga para uma operadora, seja de TV, telefonia ou de cartão de crédito, e diz seu CPF, o computador entra em ação e verifica qual é seu Score. Se ele for alto, é provável que você seja atendido rapidamente por uma operadora humana muito simpática. Se for baixo, vai esperar um bocado ouvindo um gravador com musiquinhas chatas.


Agora, ter um Score alto também tem algumas desvantagens. Você já parou para pensar por que vive sendo assediado por ofertas de transações de todo tipo, seja por carta, telefone ou e-mail? E por que todo dia recebe pedidos de doações de grupos ditos beneficentes? Isso é culpa de seu alto Score, que é conhecido e compartilhado por muita gente que está atrás de seu rico dinheirinho.


Seu Score pode estar alto hoje, mas, se por alguma trapaça da sorte você perde seu emprego ou sua microempresa entra em dificuldades, o índice vai cair e será complicado recuperá-lo. Quem tem um Score baixo costuma ser mal avaliado nas entrevistas de emprego ou quando busca auxílio para seu incrementar seu comércio.


Esse aspecto do Score é intrinsecamente injusto. Quase ninguém perde emprego porque não quer trabalhar. Em geral, pessoas que perdem emprego ou comerciantes que fecham lojas são vítimas de desajustes econômicos criados pelos políticos e economistas no poder.


O Score pode até ajudar o comércio e as empresas de crédito e seguros, mas também contribui para aumentar o fosso entre os que têm muito e os que não têm nada.


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