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Coração em perigo
Ciência e Saúde

Coração em perigo

| ENTREVISTA | Endocrinologista alerta para o alto nível de gordura saturada na composição do óleo de coco e para os riscos cardiovasculares que seu consumo rotineiro pode acarretar
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Não se pode ter o óleo de coco como parte de uma rotina alimentar saudável e fazer isso pode levar à elevação de riscos cardiovasculares, essa é a opinião da presidente do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), Maria Edna de Melo. Para a endocrinologista, os altos níveis de gordura saturada da composição do óleo proveniente do coco é a justificativa. A médica é taxativa: a propagação do consumo de óleo de coco é sensacionalista e não tem amparo científico.

Domitila Andrade

 

O POVO - Qual a opinião da Sbem em relação ao óleo de coco e ao uso culinário dele?

Maria Edna de Melo - É uma opinião alinhada com outras entidades, como a Abeso, por exemplo, que esse óleo contém um tipo de gordura que é mais heterogênea, e favorece um maior risco cardiovascular. Então, é um óleo que não deve ser consumido rotineiramente. Ele pode ser consumido, mas de uma forma esporádica, e não fazendo parte de uma dieta saudável.

 

OP - O que ele contém?

Maria Edna - As gorduras, os óleos, eles são constituídos por ácidos graxos. E temos três tipo básicos de ácidos graxo: os poliinsaturados, monoinsaturados e os saturados. Essa gordura saturada é classicamente - não é algo novo, é antigo e bem estabelecido, e sempre que sai novo estudo ele confirma essa informação - associada a um maior risco de doença cardiovascular. Vai haver um aumento do colesterol em virtude do consumo exagerado desse tipo de gordura. O óleo de coco é muito rico em gordura saturada.

 

OP - O óleo de coco pode aumentar o colesterol bom ou ele só tem influência no colesterol ruim?

Maria Edna - Quando você tem um aumento de colesterol total, algumas vezes, pode ter um leve aumento no colesterol bom. Mas o HDL é muito baseado em características individuais. Então, de forma alguma, se vai ter uma aumento significativo no sentido de proteger. No geral, o ácido graxo saturado vai levar ao aumento excessivo do LDL, que é o colesterol ruim.

 

OP - E o que o LDL em altos níveis pode acarretar ao organismo?

Maria Edna - Ele vai se depositar nos vasos, vai formar placas, que é o que a gente chama de ateromatose. Dependendo do nível, pode obstruir o fluxo sanguíneo para o coração ou para o cérebro, o que predispõe um risco maior de infarto e acidente vascular cerebral.

 

OP - Toda gordura saturada é ruim?

Maria Edna - Sim, não há estudos de que algum ácido graxo seja comprovadamente considerado bom. Quando se vai para internet, existem pessoas que fazem uma apologia (que acaba sendo mais uma apologia do que uma visão crítica), dizendo que esse ácido graxo do óleo de coco tem num sei quantas cadeias, mas quando se junta, realmente, o potencial de dano à saúde é semelhante. Não tem nenhum estudo que isente a gordura saturada.

 

OP - E a que se deve então essa propagação de que o óleo de coco é bom?

Maria Edna - Acho que a palavra mais adequada para explicar é sensacionalismo. Porque se você não tem dado de literatura suficiente para sair recomendando, como um profissional de saúde se submete a esse tipo de orientação? Na dúvida, se ainda falta algo a saber sobre os componentes dessa gordura saturada, se deveria recomendar com moderação, com preocupação. Muitos que defendem o óleo de coco, dizem que quem fala mal da gordura saturada é porque quer defender o óleo de canola. O meu argumento é que um litro de óleo de canola custa me média entre R$ 7 e 8 e essa semana fui no supermercado e 500 g de óleo de coco custava R$ 50. É um tipo de óleo que não tem um benefício comprovado, pela sua composição, inclusive, pode levar a risco vascular, é extremamente caro, muito mais caro que, por exemplo, azeite de oliva. Então, nem mesmo uma justificativa financeira ampara essa substituição.

 

OP - Que outros óleos que também são utilizados têm nível de gordura saturada elevado?

Maria Edna - A banha de porco é uma gordura que se assemelha muito ao óleo de coco. Só que o óleo de coco aparentemente tem um pouco mais de gordura saturada. Por isso que ele fica tão duro em temperatura ambiente. Esse tipo de gordura que é comumente encontrada em gordura animal.

 

OP - Nenhum outro óleo vegetal tem o mesmo nível de gordura saturada?

Maria Edna - Pelo contrário, eles são ricos em poli e monoinsaturadas. Mesmo o de soja e é o mais barato, a composição acaba sendo muito melhor. A estrutura dos óleos vegetais, como milho, soja, canola, girassol é mais de poli e monoinsaturadas. É por isso que a pesquisadora de Harvard fala (que o óleo de coco é pior do que banha de porco). Porque tem mais gordura saturada. Eu vou falar que é um veneno (como ela falou)? Olha, se for uso ocasional, se usar em um preparo culinário como um ingrediente esporádico, não é um veneno. Para ser um veneno, dependerá da quantidade. Se usar uma vez ou outra, não há prejuízo, mas se é parte de uma rotina, isso acaba podendo trazer riscos.

 

OP - Há nível de segurança no uso?

Maria Edna - O consumo de gordura saturada não pode ultrapassar 10% da ingestão diária total. E aí você vai comer carne, frango, queijos, vai tomar leite. Isso acaba tendo gordura saturada, o que dificulta o consumo seguro de óleo de coco. Não tem como quantificar e na dúvida é bom que se use óleos que tenham outros tipos de ácidos graxos.

 

OP - Existem benefícios que o óleo de coco possa trazer?

Maria Edna - Não. Não é algo que você vai jogar no lixo, mas não vai inserir o uso de forma regular. Tem gente que passa na pele, que passa no cabelo, mas para fim de emagrecimento, ou de saúde na ingestão em si, ele não tem respaldo científico nenhum.

 

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