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Hawking, o rei do espaço infinito
Ciência e Saúde

Hawking, o rei do espaço infinito

Professor Celio Rodrigues Muniz destaca as descobertas de Hawking e o legado que ele deixa para a Ciência
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CELIO RODRIGUES MUNIZ

PROFESSOR DA UECE

celio.muniz@uece.br

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“Poderia viver recluso numa casca de noz e me considerar rei do espaço infinito”. Nunca uma frase de tamanho apelo poético e dramático, proferida por Hamlet na peça homônima de Shakespeare, aplicou-se de forma tão contundente a um ser humano. É verdade que não se trata de qualquer ser humano, e sim um dotado com a arguta capacidade de pensar profundamente o universo físico, com tudo o que este encerra de encanto e de...terror. Estamos falando de outro Stephen, não o King, e sim o igualmente famoso Hawking, cuja popularidade, conjugada ao enorme respeito vindo dos seus pares, rivaliza com a de Einstein, o qual desembarcou do planeta Terra no último dia 14, deixando uma irreparável lacuna nas hostes de cosmólogos e astrofísicos mundo afora.


Há não muitos anos, Hawking podia ser visto pilotando com rapidez sua cadeira de rodas nas calçadas e gramados da Universidade de Cambridge, onde ocupava a cátedra lucasiana de física matemática, a mesma outrora ocupada pelos grandes Isaac Newton e Paul Dirac, causando certo temor nos perplexos transeuntes.


Um indivíduo verdadeiramente singular. E singularidade era a sua praia, pois juntamente com o matemático e amigo Roger Penrose ajudou a desvendar os segredos desses pontos com infinita concentração de matéria e energia, centros esfaimados de gravidade que devoram tudo ao seu alcance, de insignificantes grãos de poeira cósmica a estrelas inteiras. E que às vezes praticam o canibalismo entre si, como foi dramaticamente demonstrado na primeira indubitável detecção das ondas gravitacionais, ocorrida em 2015, as quais foram o resultado do cataclísmico entredevorar-se de dois gigantescos buracos negros, situados a um bilhão de anos-luz de distância da Terra.

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A ideia de singularidade causa desconforto em algumas mentes, pois o infinito é algo que assusta e ao mesmo tempo impossibilita qualquer compreensão razoável de sua natureza. Os teoremas de singularidade, formulados por Hawking e Penrose nos anos 60 do século passado, predizem que essas aberrações matemáticas são inevitáveis no arcabouço da Teoria da Relatividade Geral, a formulação que Einstein deu para explicar a interação gravitacional. Esta é uma teoria clássica no sentido de que a geometria do espaço-tempo é univocamente determinada pelo seu conteúdo de matéria e energia.


Por isso se diz popularmente que a matéria “encurva” o espaço. Mas uma consequência é a inevitável formação de singularidades para certas condições fisicamente realizáveis. Assim, por exemplo, uma estrela com massa algumas vezes maior que a do Sol terminará seus dias como um buraco negro, cujo horizonte de eventos esconde a temida singularidade e sua garganta voraz.


Mas a coisa muda de figura quando se leva em conta a Mecânica Quântica. Hawking foi um dos pioneiros a fazer uso dessa teoria, que é a que melhor descreve os processos microscópicos, no âmbito da Relatividade Geral, mostrando que buracos negros, ao contrário do que o imaginário popular e o nome sugerem, também podem emitir radiação, devido ao que se conhece por polarização do vácuo. Esse termo apenas designa a separação dos pares de partículas com cargas opostas que são produzidos a todo instante no vácuo quântico, causada pelas violentas marés existentes no entorno dos buracos negros.


Embora não se conheça efetivamente a teoria que amalgamará essas duas descrições do mundo numa cobiçada Teoria Quântica da Gravidade, presume-se que ela nos mostrará que as singularidades de fato não precisam existir.


As extraordinárias visões do Universo que Hawking nos proporcionou continuarão tendo desdobramentos significativos na Astrofísica e na Cosmologia durante muito tempo, para além das gerações atuais. Uma vez ele declarou que viagens no tempo não eram possíveis, pois se assim fossem, estaríamos sendo visitados por hordas de turistas do futuro. Se estiver errado, com certeza os viajantes do tempo virão à nossa época para terem o privilégio de conhecer o grande Stephen Hawking.


Professor doutor Celio Rodrigues Muniz,

Grupo de Física Teórica da Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Educação, Ciências e Letras de Iguatu.

 

NO ESPAÇO


Super-homem

“O conceito dessa mente prisioneira (de seu corpo) que explora o cosmos marcou a imaginação das pessoas”, afirmou o astrofísico Martin Rees (foto), colega de Hawking na Universidade de Cambridge. Para Bruce Benamran, um youtuber especialista em ciências, a popularidade do astrofísico se explica também pelo campo que estudava: “Os buracos negros, a origem do universo... São assuntos que fascinam”. Além disso, ele era visto como “um super-homem porque não deveria ter vivido tanto tempo”, aponta Benamran.

 

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