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A revolução que vem da vulva
Ciência e Saúde

A revolução que vem da vulva

Mulheres têm se relacionado com o próprio corpo de forma a naturalizar formatos plurais e desmistificar tabus
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Discussões em fóruns virtuais ou presenciais, compartilhamento de informações via redes sociais e aproximação entre mulheres, no que se convencionou chamar de sororidade, tem sido a tônica de uma nova fase da revolução feminina. Com ápice, até então, na década de 60, com a criação e a popularização da pílula anticoncepcional, que dissociou de vez o sexo das funções reprodutivas na mulher e deu a ele caráter de prazer, um novo momento tem sido pautado entre as mulheres: o da valorização do próprio corpo, independente de padrões, o que leva a reflexões e mudanças de como se vê a sexualidade e a saúde do corpo feminino.


[SAIBAMAIS]A vulva — composta por clitóris, pequenos e grandes lábios, meato uretral, períneo e a entrada da vagina — é protagonista dessa mudança de paradigma em relação a como a mulher se enxerga, pontua Carmita Abdo, psiquiatra, professora do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), fundadora e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP e presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). “A valorização da vulva e da vagina anda em par com a valorização da figura feminina, como se ela fosse socialmente emblemática. Elas representam a mulher, conforme a mulher ganha espaço”.


Permeados pela crença de superioridade do homem sobre a mulher, a sociedade cresce por gerações sob a ideia de que a vagina é algo indigno de admiração, diferentemente do pênis — muitas vezes exaltado. “Fomos ensinadas a não ver nada de bonito na vagina. Para mulheres, falar sobre a vagina causava vergonha, ir ao ginecologista era motivo de constrangimento. A própria dimensão prazerosa do sexo era algo que, até bem pouco tempo atrás, não estava disponível para a mulher. A mulher era coadjuvante do prazer sexual masculino”, destaca Débora Britto, médica ginecologista e sexóloga da Maternidade Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará (Meac - UFC).


Para a sexóloga, a falta de conhecimento e intimidade com a própria genitália é um aspecto importante à perpetuação de preconceitos. “Não é raro encontrar uma mulher que nunca observou a própria genitália no espelho, que não conhece o próprio corpo e nunca viu outras vulvas”, diz e acrescenta: assim, mulheres ainda ficam submissas a padrões estéticos fantasiosos. “Essa mulher continua submetida a coerções, agora estéticas, com um alto grau de ansiedade em relação aos padrões físicos que são impostos para ser considerado belo”. Ou seja, nenhuma vulva é igual a outra e não há ideal a ser seguido.


“Eu ficava muito preocupada, quando mais nova, com cor da minha vagina. O padrão machista também é um padrão branco, então tem de se ter uma vagina rosada, depilada, quase como a vagina de uma criança branca. Comecei a pensar também nessa pedofilização do nosso corpo. Tenho 33 anos, mas em algumas instâncias eu seria cobrada para ter uma vagina de uma menina de 14 anos”, reflete a professora e fotógrafa Marília Oliveira.


Para mudar cheiros, tonalidade e formatos que são naturais, muita mulheres se valem de uma higienização que Marília julga como excessiva. “O número de produtos de higiene feminina disponíveis no mercado é infinitamente maior do que o de produtos masculinos. E eles proporcionam a essa mulher ter uma vagina que não se parece com um vagina, não tem cheiro de vagina, não tem cor de vagina, que não é uma vagina. São flores do campo, são morangos, mas não são vaginas. O momento agora é de renegar algumas dessas coisas e ficar mais tranquila com o corpo e com tamanhos e formatos”, defense Marília, acrescentando que a discussão é fruto da luta feminista.


OBRA DESEJOS DA JORNALISTA E ARTISTA VISUAL DOMITILA ANDRADE

“Colorir o feminino é uma tentativa de pôr no papel o que pra mim é a essência da mulher: a poesia”


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