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A resiliência da caatinga
Ciência e Saúde

A resiliência da caatinga

Cinco anos de chuvas abaixo da média castigam o chão resiliente do bioma que está em 87,7% do território do Ceará
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A caatinga ocupa 87,7% do território do Ceará. Desse total, 11,45% estão fortemente degradados. É espaço onde a vegetação não nasce mais e o solo, fraco, acaba sendo levado por qualquer chuvinha — situação que pode atingir 100% do Estado, com assoreamento e o fim das possibilidades que a natureza tem para continuar. A resiliência do bioma que só existe no Brasil está em risco após mais de cinco anos de precipitações abaixo da média no Estado e diante de um futuro de mudanças climáticas.

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Estudos realizados pela Fundação Cearense de Meteorologia (Funceme) já indicavam, em 1992, que, do ponto de vista físico, três grandes áreas estariam em processo de desertificação: o Médio Jaguaribe, a região dos Inhamuns/Sertão de Crateús e o município de Irauçuba e regiões circunvizinhas. Foi nessa cidade, a 150 quilômetros de Fortaleza, onde Vitória, 10, aprendeu que na caatinga “tem espinho e xique-xique” e que “a maior parte dela é no Ceará”. “Em outros locais não tem porque chove mais”, ensina.


A extrema irregularidade de precipitações é um das razões que compõem a vulnerabilidade ambiental do Estado. Tem ainda as altas taxas de evaporização (causada pela temperatura e pelo vento), o predomínio de rochas do embasamento cristalino (o que dificulta o acúmulo de água subterrânea) e a predominância de solos rasos e vegetação esparsa (com pouca capacidade de proteção ao solo). Tudo isso, aliado ao uso intensivo e sem manejo da biodiversidade e às condições climáticas agressivas, faz com que se projete um cenário preocupante.


“Acredita-se que, em relação às mudanças climáticas, os processos de seca têm se intensificado. Mesmo a vegetação já sendo adaptada, com a introdução do uso pelos homens, a condição natural não fica equilibrada”, diz o agrônomo e professor do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia (IFCE), Rodrigo Gregório. Assim, um novo processo de seleção natural acontece. Sobreviverão apenas as espécies que conseguirem. “É uma demanda do nosso ambiente, que necessita de planejamento”, alerta.


Técnicas e manejos eficientes e de fácil adequação podem fazer a diferença nesse processo de desertificação. Os métodos agroecológicos, que visam não só a produção, mas a conservação do meio ambiente, também são decisivos. Assim como ter políticas públicas que consigam dar suporte à sustentabilidade e valorizem a cultura da caatinga. “De repente, a seca também vem com uma lição: ou o homem aprende a conviver com essa realidade ou esse ambiente não é adequado para ele. A gente faz de conta que a seca é algo que pode acontecer quando estamos em uma zona semiárida”, avalia o superintendente do Ibama de Pernambuco, Francisco Campelo. Na zona semiárida, as chances de registro de seca são de 60%.


O Ciência & Saúde foi à caatinga cearense. Vimos o mandacaru que, encharcado de água, consegue sobreviver. Andamos sobre as pedras que ilustram grande parte da paisagem. Ouvimos histórias como a da cabra que sobe montanhas rochosas em busca de alimento. Constatamos que é possível armazenar gravetos e deixá-los em decomposição por um ano para servirem de adubo.


As raízes profundas das catingueiras são força para que, mesmo com uma projeção de secas cada vez mais extensas e intensas, a caatinga resista. Que a resiliência continue.

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